Os principais espaços de debate e visibilidade no âmbito cultural, como as instituições de grande porte, têm demonstrado de forma mais explícita como a arte é um campo de disputa. Discutir poder nesse campo é uma tarefa que implica olhar para diversos fatores, visando os protagonistas dessa disputa e os lugares pelos quais busca-se ocupar.
A ArtReview, uma das principais plataformas de comunicação das artes, publica anualmente sua lista Power 100, determinando através de um júri de especialistas – selecionado e anônimo – quais foram as pessoas, coletivos ou mecanismos mais influentes no mundo da arte ao longo do ano. A lista de 2022 chegou e nela encontramos, através de uma série de indicadores, o que a plataforma entende por influência e poder no atual contexto da arte. Entre os destaques da lista, está o fato de um coletivo asiático ocupar o topo, além do brasileiro Adriano Pedrosa, que subiu no ranking por seu recente trabalho desenvolvido no MASP.
As duas primeiras posições do Power 100 constatam a relevância da organização e curadoria de dois dos maiores eventos da arte no Norte Global: Bienal de Veneza e Documenta.
O primeiro lugar é ocupado pelo coletivo artístico ruangrupa, baseado em Jacarta, capital da Indonésia. O coletivo foi responsável pela direção artística da 15ª edição da Documenta, que ocorre a cada cinco anos na cidade de Kassel, na Alemanha. É a primeira vez que a grande exposição é curada por um coletivo, e de modo geral, por alguém da Ásia. Desde 2019 ruangrupa aparece no top 10 da ArtReview, tendo ocupado o segundo, o terceiro e o décimo lugar.
Cecilia Alemani, curadora da 59ª Bienal de Veneza, já havia aparecido na lista da ArtReview de 2021 na 18ª posição, pelo fato de já ter sido anunciada para conceber uma edição da mais antiga bienal do mundo. A grande exposição ocorreu entre abril e novembro deste ano sob o título “The Milk of Dreams” – emprestado de um livro da artista surrealista Leonora Carrington. Reunindo obras de 213 artistas de 58 países diferentes, a exposição refletiu a condição humana – ou pós-humana – através das relações pessoais, corporais e ambientais sob perspectivas alternativas, em contraponto à visão humana racional ocidental. A influente curadora aparece na lista desde 2017.
O terceiro lugar da lista é ocupado por um fenômeno que tem avançado sobre os locais de trabalho no cenário cultural, especialmente nos Estados Unidos e na Europa. Trata-se da sindicalização e organização de trabalhadores culturais, que têm se articulado em prol de melhores condições laborais. “Unions” é apontado pela lista como um movimento ativista, revelando insatisfações do setor sobre baixos salários, jornadas de trabalho abusivas, falta de direitos como planos de saúde, entre outras.
O impacto da produção de artistas contemporâneos pode ser dimensionado por uma série de fatores e contextos, desde suas contribuições formais e estéticas às críticas sociais e políticas visando questões relevantes ao debate público. Em quarto lugar da lista está Hito Steyerl, artista com visibilidade internacional, tendo participado da 32ª Bienal de São Paulo, apresentado trabalhos no MoMA de Nova York e circulado suas obras em diversos outros países. As obras de Steyerl criticam fenômenos contemporâneos com metodologia interdisciplinar e de forma particular, e reafirmam sua relevância por estar na lista desde 2013, chegando a alcançar o topo em 2017.
Simone Leigh, artista estadunidense, foi premiada na Bienal de Veneza deste ano com Leão de Ouro por sua participação na curadoria geral. Suas poderosas esculturas em grande escala e outras ações durante a bienal, incluindo a leitura de escritoras negras, evidenciam o lugar que a artista ocupa no cenário atual, pela construção de uma escultura que contempla novas imagens sobre as mulheres negras, e valorização de outras artistas e intelectuais. Leigh foi a primeira mulher negra a receber o prêmio, ao lado de Sonia Boyce, premiada pelo pavilhão da Inglaterra. A artista figura no sétimo lugar da Power 100 de 2022.
Em oitavo lugar está a consagrada Nan Goldin, referência da fotografia que neste ano ganhou um documentário dirigido por Laura Poitras, diretora premiada. Intitulado “All the beauty and the bloodshed”, o documentário recebeu um Leão de Ouro durante o festival de cinema de Veneza.
Entre as primeiras posições do Top 100 aparecem também intelectuais que têm contribuído nas discussões do mundo da arte, como Fred Moten em 5º lugar, Anna L. Tsing em 13º – tendo ocupado o 2º lugar no ano passado – e Donna Haraway no 16º lugar.
Adriano Pedrosa, diretor do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand – MASP, subiu muitas posições em comparação aos anos anteriores. Pedrosa aparece na lista desde 2012, quando ficou na 98ª posição. Agora, o diretor do MASP aparece em 59º, especialmente pelo trabalho desenvolvido nas Histórias do MASP, os ciclos curatoriais anuais que recontam histórias relacionadas à formação social e cultural brasileira. O verbete sobre Pedrosa destaca também a iniciativa institucional de contratar os curadores Kássia Karajá, Renata Tupinambá e Edson Kayapó para compor o time de curadoria do MASP. O próximo ciclo de Histórias, previsto para 2023, será focado nas mais diversas culturas indígenas do nosso território.
Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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