Mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo estavam conectadas nesta sexta-feira (26) assistindo a abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. Com cerca de quatro horas de duração, a cerimônia marcou a história do esporte mundial ao ser a primeira realizada a céu aberto e, mais do que isso, impressionou ao propor um amplo trajeto pelo Rio Sena, artéria principal da cidade, que recebeu 85 barcos e 6.800 atletas de 205 delegações.
Para os amantes da arte, algumas cenas se destacaram. Especificamente duas: o trajeto realizado pela figura mascarada, que carregava a tocha olímpica das Catacombes até as margens do Rio Sena e a referência de cenas amplamente retratadas na arte como A Última Ceia, de Leonardo da Vinci, Le Festin des Dieux (A Festa dos Deuses), do pintor Jan van Bijlert ou, ainda, a pintura Baco, de Caravaggio.
O homem que carrega a tocha passa por vários cantos de Paris, promovendo imagens panorâmicas da cidade em uma performance híbrida entre ao vivo e gravações em ambientes internos dos edifícios históricos, transmitidas por telões para o público presente. Cerca de uma hora após o início do evento, o homem entra no Museu do Louvre e grandes obras entram em cena, começando pelas cariátides, que são quatro figuras femininas esculpidas em estilo romano que servem de colunas para a entrada do salão expositivo onde estão reunidas obras primas das coleções reais.
Em seguida, as esculturas a Vitória Alada de Samotrácia, encontrada em 1863 na ilha de Samotrácia, no santuário dos “Grandes Deuses”, local em que as pessoas rezavam por proteção contra os perigos do mar. A estátua foi feita como uma oferenda aos deuses e posicionada em uma altura que permitia aos passantes vê-la de longe, como uma mensageira da vitória. No Louvre, ela está posicionada no topo da escadaria Daru, uma das seis grandes escadarias construídas durante o Segundo Império no século XIX pelo arquiteto Hector Lefuel.
O tour segue até chegar na Afrodite, conhecida como Venus de Milo. A estátua chegou ao museu em 1821 como uma doação do rei Luís XVIII, encontrada na ilha de Melos (ou Milos, como é conhecida hoje), na Grégia. A estátua ganha vida quando a tocha passa e segue seus passos com o olhar até que ele entre no grande salão com uma série de pinturas famosas: The Magdalen with the Smoking Flame (1640) e St Sebastien Attended by St Irene (1650), do pintor francês Georges de La Tour; Mademoiselle Caroline Rivière (1806) e Une odalisque, de Jean-Auguste-Dominique Ingres; Self-Portrait with Her Daughter, Julie (1789), da pintora Élisabeth Vigée Le Brun; A Morte de Marat (1793), de Jacques-Louis David.
Esta última em especial, estava vazia, sem Marat, a figura humana central. É nesse momento que o homem percebe que algumas pinturas estão vazias, sem seus personagens icônicos, que saíram das pinturas para acompanhar, animados, a grande abertura das Olimpíadas pela janela, onde os barcos de diferentes delegações passavam no Rio Sena com atletas acenando as bandeiras de seus países.
A Monalisa, principal obra do acervo que recebeu 8,9 milhões de visitantes em 2023, não poderia ficar de fora da narrativa. No próximo salão, encontramos o vidro que protege o quadro totalmente estilhaçado e a tela desaparecida, ao lado de uma pista direta: um grande buraco no chão que leva para uma saída do museu. Ele corre pelos telhados e chega até o Musée D’Orsay, conhecido pelo extenso acervo de obras impressionistas e pós-impressionistas. Ao passar pelo famoso relógio da fachada, o caminho continua, agora, por outras referências do cinema e da literatura, até desembocar em uma esquete dos Minions em um submarino, que explode e deixa escapar a pintura que tinham roubado. Em seguida, a Monalisa surge, intacta, na superfície do Rio Sena para o público.
Na seção de festividade, o evento apresentou um desfile de moda com DJs, drag queens e dançarinos. Intercalada com outros momentos das apresentações que aconteciam simultaneamente, a mesa volta a aparecer sob o tema de diversidade, com performers apresentando danças inspiradas na cultura ballroom, que surgiu em Nova York na década de 1920.
No fim deste trecho, o cantor e ator francês Philippe Katerine aparece pintado de azul, vestido como a divindade grega Dionísio, cantando uma faixa do seu novo álbum. Segundo a organização, “A interpretação do deus grego Dionísio nos conscientiza do absurdo que é a violência entre seres humanos”.
A produção faz referência à cena da Última Ceia no começo, com o posicionamento dos personagens alinhados em um lado da mesa e ao final, com as festividades que incluem Dionísio, que fazem lembrar as cenas da mitologia grega registradas em pinturas como a de Jan van Bijlert em 1635-40, pertencente ao Museu Magnin, também localizado na França e o retrato de Baco, pintado pelo barroco Caravaggio em 1595.
Toda a narrativa criada entorno das artes plásticas fez parte de uma cerimônica inédita, repleta de referências da cultura francesa, país que recebe a edição deste ano dos jogos.