O Instituto Tomie Ohtake, por meio do programa “Tomie Ohtake visita”, apresenta a exposição “Coleção Imaginária de Paulo Kuczynski”. A segunda edição da iniciativa traz obras de acervos privados como as de Eliseu Visconti até Adriana Varejão. Com curadoria de Jacopo Crivelli, a mostra mantém o objetivo do instituto de buscar democratizar o acesso a obras de artistas consagrados e contribuir para a história da arte moderna brasileira.
Além de marchand (negociante que compra e vende obras de arte), Paulo Kuczynski é, sobretudo, um colecionador de artes desde meados da década de 1960. Em entrevista ao canal Art1, ele ressaltou a importância de um marchand: a capacidade de descobrir obras de arte inéditas. Com mais de 50 anos de experiência no mercado de arte, sua afirmação se confirma, especialmente, diante do grande número de peças nunca antes vistas, mas que a exposição agora nos dá a oportunidade de conhecer.
Centrada principalmente no período modernista, a exposição no Instituto Tomie Ohtake cativa imediatamente os visitantes com as obras de dois artistas pioneiros: Victor Brecheret e Maria Martins. Brecheret, amplamente conhecido pela obra “Monumento às Bandeiras” (1984), desempenhou um papel fundamental na revolução da linguagem escultórica no Brasil como um dos primeiros escultores modernistas brasileiros. Já Maria Martins foi uma das primeiras brasileiras a se destacar na escultura ao desafiar convenções sociais e explorar tabus de sua época. Enquanto Brecheret desenvolvia formas suaves e orgânicas, Martins mergulhava em figuras angulosas e estilizadas, muitas vezes enfatizando os aspectos eróticos e surreais, como fica evidente em sua peça “O impossível” (1945), exibida na exposição.
Ao seguir para a primeira sala à direita, o visitante encontra importantes pinturas de Eliseu Visconti, que representam o impressionismo brasileiro e abriram caminho para a experimentação artística das gerações seguintes. Complementando as esculturas de Brecheret, a sala também apresenta obras de Antônio Gomide. Em entrevista ao canal Art1, Kuczynski chama a atenção para a semelhança entre as faces alongadas das esculturas de Brecheret e os traços encontrados nas pinturas de Gomide: “Brecheret é um Gomide esculpido e Gomide é um Brecheret pintado”.
A partir daí, os visitantes podem mergulhar nas obras de artistas conceituados como Lasar Segall, Oswaldo Goeldi, Di Cavalcanti, Cândido Portinari, uma inédita coleção do pintor Ismael Nery e muitos outros. A exposição apresenta, ainda, uma vasta coleção de Alfredo Volpi, um artista fundamental no acervo do colecionador, chegando até duas pequenas, mas valiosas pinturas de Tarsila do Amaral: “Paisagem com porquinhos” (1943) e “Paisagem com dois porquinhos” (1929).
É notável a presença do quadro “Vendedora de Flores” (1947), da artista Djanira, cujo trabalhos, após a sua morte, foram excluídos das principais narrativas da história da arte brasileira nas últimas décadas. A mudança se consolidou quando o MASP (Museu de Arte Moderna de São Paulo) apresentou a exposição “Djanira: a memória de seu povo”, em 2019. Evidenciando, assim, um processo de atualização nos estudos da arte brasileira dentro dos últimos anos.
Na segunda sala, localizada à esquerda da exposição, o foco se volta para os períodos concreto e neoconcreto da arte moderna brasileira. Enquanto o concretismo celebrava a objetividade, a simplicidade e as composições planejadas, desprovidas de referências ou símbolos, o neoconcretismo surgiu como um contramovimento que buscava infundir a subjetividade na arte. Assim sendo, obras como as esculturas de Ione Saldanha são expostas ao lado de pinturas de Alfredo Volpi, convidando a uma comparação de como as obras dos dois artistas evoluíram a partir de seus primeiros estudos figurativos. As icônicas composições de bandeiras de Volpi resultaram de seu estudo de grandes fachadas e padrões de telhados, enquanto as esculturas de Saldanha se originaram de uma exploração de projetos urbanos.
Nesta sala, Crivelli também cria diálogos entre as obras “O Antes é o Depois” (1973) de Lygia Clark e “Tudo Consumido” (1964) de Waldemar Cordeiro, cujas propostas de transcender o plano se manifestam de formas distintas. Ademais, a sala abriga conexões entre as obras do artista Di Cavalcanti com as obras da artista Mira Schendel, de Arthur Luiz Piza e de Antonio Bandeira, alcançando a impactante obra “Carne Marinha” (1999), de Adriana Varejão.
Essa interação entre os artistas destaca a relevância dos seus trabalhos, uma vez que a curadoria é responsável por criar um ambiente que estimula a reflexão, promove o diálogo entre diferentes estilos e ideias que nos permite apreciar a diversidade e a riqueza da expressão artística.
“Talvez a melhor chave para entender essa coleção imaginária e o olhar inteligente de seu criador esteja precisamente na imensa variedade de estilos e poéticas que permite identificar tanto as preferências pessoais quanto a profunda compreensão da evolução da arte nacional”, afirma Crivelli Visconti.
Serviço:
Exposição: “Coleção Imaginária Paulo Kuczynski”
Curador: Jacopo Crivelli Visconti
Instituto Tomie Ohtake: Rua Coropé, 88 – Pinheiros, São Paulo
Visitação: De 20 de maio a 13 de agosto de 2023 – Grátis todos os dias.
Larissa Silva, pesquisadora e curadora independente, graduada em Arte: História, Crítica e Curadoria pela PUC-SP.
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