A abstração na fotografia possui diversas manifestações e processos particulares, assim como ocorre em outras linguagens artísticas, como a pintura, por exemplo.
Refletir sobre a fotografia abstrata implica identificar variados tipos de construção de imagens não figurativas.
A fotografia foi por muito tempo reconhecida como uma técnica estritamente documental, não artística. Para ampliar as possibilidades da técnica, experimentações começaram a ser realizadas no início do século XX, acompanhando o auge das transformações modernistas. Inspirados por movimentos de vanguarda, como o cubismo, fotógrafos passaram a explorar as formas em trabalhos com estudos de luz. Em muitos casos os elementos comuns do cotidiano eram o ponto de partida, como vemos no trabalho de Paul Strand, importante fotógrafo estadunidense do século passado.
No Brasil, as experimentações com fotografia abstrata começaram a ganhar força nos foto clubes, em especial o Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), importante organização na história da fotografia moderna brasileira. O clube iniciou suas atividades no final da década de 1930, sendo um espaço de trocas e debates acerca da fotografia artística, se mostrando um ambiente perfeito para o desenvolvimento de diversas correntes, incluindo a abstrata.
A fotografia arquitetônica foi uma vertente intensamente trabalhada por integrantes do clube, como José Yalenti, Gaspar Gasparian e Thomas Farkas. Nesse estilo, edificações e elementos comuns da paisagem urbana se transformam em composições geométricas abstratas, a partir dos contrastes de luz e sombra.
José Oiticica Filho desenvolveu uma pesquisa no abstracionismo partindo de elementos da natureza, como insetos, por exemplo. Utilizando a técnica de microfotografia, o artista ampliava elementos orgânicos e apresentava uma abstração mais fluída.
A fotografia abstrata contemporânea se aventura cada vez mais na manipulação do processo de captura de uma imagem, assim como sua edição. Há trabalhos que valorizam o movimento, os rastros, desconfigurando um referencial figurativo no momento do clique. Trabalhos como Inquietudine III de Juliana Sícole nos mostram como a fotografia pode materializar diversos tempos, movimentos e espaços em uma mesma imagem.
Uma das possibilidades de abstração na fotografia é a composição visual formada pela ampliação de um objeto. Dessa forma, o figurativo se torna a base para uma nova representação. No trabalho Faca, de Pedro Victor Brandão, por exemplo, encontramos a ampliação da lâmina de uma faca, de modo que o objeto ganha outra leitura quando o enxergamos em uma escala quase impossível ao olho nu.
As cores também são elementos de grande relevância para esse estilo de fotografia. Alguns artistas aproximam a linguagem fotográfica à pintura, estruturando composições ricas em cores e formas geométricas, como vemos em Trono, de João Castilho.
Entendendo que a luz está em constante movimento, a fotografia abstrata ultrapassa os limites de uma técnica vista muitas vezes como permanente, rígida. Essas imagens ampliam nossas perspectivas sobre um mundo inconstante, que pode ser visto em escalas micro e macro, adquirindo novos contornos.
Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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