Herdeiros de grandes pintores e escultores da nossa história da arte ocidental, artistas contemporâneos hiper-realistas estudam materiais e formas e levam muito a sério os detalhes da nossa natureza.
Tendo os primeiros traços de realismo na pintura em 1855 com Gustave Courbet, a arte chega na contemporaneidade superando a limitação de materiais, a invenção da fotografia e a disseminação das mídias. Se reinventa e busca elementos que ainda não foram estudados e desenvolvidos.
Partindo da própria palavra realismo, entende-se a referência direta ao que é real. Trata-se do que se vê de fato sem o véu de elaborações românticas e fantasiosas. A simplicidade das ações e a crueza das formas. Os artistas contemporâneos apresentam composições que vão muito além das esculturas tradicionais. São obras que chocam ao demonstrar uma concretude até mais detalhada do que os olhos nus podem ver.
É o caso do hiper-realismo que trabalha com esculturas tão viscerais que podem ser levemente assustadoras ao nos colocar em dúvida sobre o que é ou não realidade, como observaremos nos três artistas destacados.
RON MUECK
Rugas no rosto, fios de cabelo inseridos um a um, poros e transparência da pele aparentes. O trabalho do australiano Ron Mueck, já exposto em diversos países do mundo, tem um senso de concretude latente e espanta a maioria das pessoas que o vê pela primeira vez.
Suas esculturas são muito sofisticadas nos detalhes. São pessoas normais, com seus dilemas, problemas e questões muito pessoais, o que aproxima ainda mais da sensação de realidade. A vontade é de querer conhecê-los, saber suas trajetórias e o que possivelmente iriam nos dizer, como em Woman With Shopping.
As proporções das esculturas, no entanto, nos tiram dessa ilusão. Algumas são muito grandes, outras muito pequenas e precisam de pedestal para ficar na altura dos olhos. Mas, ainda assim, como se vê na obra Woman with Sticks, a personagem tem peso, tem equilíbrio, tem uma certa vermelhidão natural da pele e existe como se respirasse.
Silicone, fibra de vidro, cabelos humanos e tinta a óleo são alguns dos materiais chave para construir esses detalhes.
PATRICIA PICCININI
A artista, também australiana, trabalha com um tema muito peculiar. Seu trabalho tem influência no animalesco. Seus personagens são criaturas surreais, uma espécie de cruzamento entre humanos e animais.
O primeiro momento de observação é de estranheza e comum rejeição. Um segundo olhar já nos aproxima de uma afeição e compaixão pela cena assistida. Em The Long Awaited, um menino e uma criatura idosa estão descansando juntos. Suas expressões são calmas e tranquilas. Há um cuidado entre eles e uma confiança muito grande ao adormecerem juntos. A criatura, com elementos humanos, já não nos parece mais estranha, se torna então, familiar.
Os detalhes das obras da artista são ainda mais gritantes por trazerem à realidade personagens que são fantásticos. Nos aproximamos deles em detalhes, seus olhos brilham e tem expressões faciais como as nossas.
Possuem até uma cerca inocência e fragilidade no olhar e acabamos por nos espelhar nessas criaturas, como em The Young Family.
Artista brasileiro emergente, Giovani Caramello surge inspirado por clássicos escultores antigos e por seus colegas contemporâneos. Um dos primeiros artistas a trabalhar com hiper-realismo no Brasil, Giovani traz muita personalidade para a arte brasileira.
Suas figuras são carregadas de sentimento. Com expressões faciais bem definidas, seus personagens jovens têm uma dramaticidade no olhar, como o menino com capa de super herói da escultura Sozinho que passa por conflitos nas transições do amadurecimento.
Seu principal material usado nas primeiras obras é resina e silicone. Ao perceber que o silicone traz à obra tantos detalhes que retêm a atenção do público quase que por completo, o artista passou a utilizar cada vez menos silicone para despertar outro olhar voltado aos sentimentos e conceitos dos trabalhos para além da técnica.
O trabalho do artista, recente, mas muito bem desenvolvido no que se propõe, está em constante construção e transformação.
Victoria Louise é crítica e produtora cultural, formada em Crítica e Curadoria e Gestão Cultural pela PUC-SP. É fotógrafa independente e colunista da Artsoul.
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