Na infância foi apelidado pelos familiares e moradores de “Pequeno Leonardo do Sertão” e podemos dizer que Pedro Américo traçou seu destino nessa busca. Romancista, poeta, cientista, teórico da arte, ensaísta, filósofo, político, professor e pintor. Prodígio na cidade de Areias, na Paraíba onde, ainda criança, conhece o naturalista Louis Jacques Brunet e o acompanha na expedição para desenhar.
Aos 13 anos está matriculado na Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro, apelidado agora como “Papa-Medalhas”. Sua jornada artística e intelectual é vasta, dinâmica, profunda e na questão econômica turbulenta, chega a vender as medalhas para seu sustento, na tentativa de aproveitar o máximo suas viagens e tudo o que o local permitia para seu aperfeiçoamento. Em Paris, na academia, torna-se discípulo de Ingres, estuda no Instituto de Física de Ganot, Arqueologia com Beulé, é Bacharel em Ciências Sociais na Sorbonne e Doutor na Universidade de Bruxelas, numa pesquisa entre arte, ciências e o progresso social. Erudito e com talento artístico invejável, suscitou inveja e admiração, em Florença e Paris consagrado, o governo italiano solicitou um autorretrato para ser exposto na galeria de retratos do museu Uffizi, colocado ao lado de Ingres.
No retorno ao Brasil, lecionou arqueologia, história da arte e estética na Academia Imperial e dirigiu as seções de arqueologia e numismática do museu. Seu reconhecimento por aqui se dá ao executar uma tela de grande dimensão sobre a guerra do Paraguai, Batalha de Campo Grande, enaltecendo o Império e ganhando apoio da imprensa. Vive entre Brasil e Europa, em Florença, outra encomenda do governo brasileiro, novamente sobre a guerra, A Batalha do Avaí, realizada entre 1874 e 1877. Para pintá-la foram desalojados 40 mil livros da biblioteca do Convento Santíssima Anunciata, devido seu tamanho. Exposta em Florença, com a presença de D. Pedro II e diversos intelectuais que estavam na cidade devido as comemorações do quarto centenário do nascimento de Michelangelo.
Pedro Américo diante da escultura de David discursa em duas línguas, ele e a obra foram assuntos em todos os jornais europeus e Pedro Américo uma personalidade estampado em lojas e cafés. Ao término da exposição em Florença a Batalha do Avaí chega ao Rio de Janeiro, a crítica a considera medíocre e plagiada da pintura Batalha de Montebello de Gustave Doré. Exposta num barracão no Largo do Paço, ocorreu tentativa de incêndio diante da manifestação pública, num confronto entre a pintura de Pedro Américo e a Obra de Vitor Meirelles, Batalha dos Guararapes. Em 1880, Pedro Américo escreveu um discurso sobre Plágio na Literatura e na Arte, numa tentativa de defesa.
Em 1888, recebe uma encomenda do governo de São Paulo, outra grande composição, a pintura Independência ou Morte. Outra crítica de plágio com a pintura referente de Ernest Meissonier Batalha Friedland, criando uma instabilidade diante a criatividade do artista. No ano seguinte expõe uma fotografia e estudos da obra Independência ou Morte na Exposição Universal de Paris, elogiado pelo próprio Meissonier e por toda a academia. As encomendas do Estado para o artista, está inserido dentro do contexto de Pintura Histórica, e entendesse um fato ou acontecimento da humanidade, entretanto dentro dessa temática a história religiosa e mitológica está contida e podemos dizer que aparece muito cedo na história da arte; a representação de batalhas, coroações, invasões surge no barroco e tem o apogeu no século XIX.
Pedro Américo adquire uma formação acadêmica, a pintura histórica é o ápice da pintura dentro da instituição, algo que todo aluno e artista almeja, onde a completude e poder de síntese se demonstra. A pintura histórica, nesse período, já havia sido abalada com o Realismo de Gustave Courbet, principalmente com sua pintura O Ateliê do Artista de 1855, onde ironicamente classifica sua pintura uma alegoria realista e a executa em dimensões avantajadas, como eram geralmente as pinturas históricas. Pinturas para impressionar, para ludibriar, a história dos vencidos. Assim, a pintura Independência ou Morte, é uma alegoria em cima de fatos, uma narrativa para construção do imaginário da nação.
Pedro Américo visita a região do Ipiranga, desenha e esboça a paisagem, as plantas, a casa que servira de apoio a comitiva, pesquisa todo o vestuário. Mas, claro, elabora uma composição pertinente a temática, a independência da pátria pelo Imperador D. Pedro I. Existe aqui uma livre poética, um heroísmo a ser enaltecido, desencadear uma imagem simbólica do instante do Grito. Uma síntese dos movimentos de independência, representado pelo Rei. Historicamente o momento é de conflito com todo o processo político que desencadeia a República. O simbolismo do Imperador como protagonista da independência causa uma celeuma, renegando todo o processo e batalhas para a causa.
Já foi tido, que a obra possa ser a pintura mais conhecida da arte brasileira, devido sua imagem ser usada como ilustração dos livros de história, mas também rejeitada e ignorada. Popularmente ninguém conhece Pedro Américo e sua pintura se tornou mera ilustração de um episódio questionado, mas devemos entender que a obra é uma encomenda, e que o fato do grito nas margens do Ipiranga é real, e a obra apresenta uma poética idealizada do momento, devemos entender o processo histórico que a obra foi confeccionada. Apesar da formação do artista dentro da academia, a sua pintura, a fatura está muito mais próxima do romantismo e o realismo. Pedro Américo é expressivo nas pinceladas, certeiro nas cores e tonalidades, pinta rápido, dinâmico nas passagens do claro e escuro, um naturalista. Apesar de ser discípulo de Ingres, flerta com Gros e Gericault, artistas que trabalham dentro de uma poética romântica, em oposição ao clássico da academia.
Uma de suas últimas pinturas, uma encomenda da República, é Tiradentes Esquartejado; aqui a influência de Gericault é direta. Além da temática, sua pintura aproxima-se ao naturalismo desencadeado nas últimas décadas do século XIX. Seria justo que Pedro Américo estava alicerçado com o desenvolvimento da pintura, coerente plasticamente com o período, que não classificaria como acadêmico. A pintura mais naturalista do período, rubinista.
O crítico Gonzaga-Duque, no seu livro A Arte Brasileira, o exalta e o destrói. Questiona sobre a escolha da Pintura Histórica, ultrapassada, mas vê a pintura, as cores (que admira), a composição e vê qualidades. No Capítulo Progresso, Gonzaga-Duque abre com Pedro Américo, ele é o artista da Academia e conclui: “Qualidades e defeitos, vulgaridades e raridades, precisão e prolixidades, engenho e imitação, foram a personalidade de Pedro Américo, talvez o maior e o mais simpático artista brasileiro.”
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