A exposição retrospectiva José Damasceno: moto-contínuo foi inaugurada no final de abril com a reabertura da Pinacoteca de São Paulo, que ocorreu após a flexibilização das medidas de contenção da pandemia na metrópole paulistana. Montada no quarto andar do prédio Pina Estação com obras produzidas entre 1989 e 2021, trata-se da maior individual do artista já feita, e a curadoria é assinada por José Augusto Ribeiro.
O andar da Pina Estação – que possui um pé direito generoso – recebe um panorama que cruza os percursos da poética do artista nas últimas décadas, assim como suas experimentações espaciais. Esta exposição apresenta cerca de oitenta obras em diversas linguagens como desenho, escultura, instalação, serigrafia e fotografia, sendo grande parte composta por trabalhos que são vistos pela primeira vez em São Paulo ou se reapresentam na cidade depois de muitos anos.
A expografia é configurada por espaçamentos e respiros necessários entre obras, considerando as dimensões monumentais de algumas instalações como Trilha Sonora, por exemplo, que ocupa uma parede inteira com martelos presos com pregos. Essa instalação é um bom exemplo de como o artista explora a repetição de objetos comuns para propor reflexões, que podem ir do questionamento da produção em massa de tais objetos, suas novas funções adquiridas na arte, seus novos valores estéticos no espaço expositivo, entre outras. É importante frisar que, apesar de construídas através de objetos corriqueiros, as obras de Damasceno possuem forte apelo estético.
José Damasceno parte de elementos ordinários para promover uma suspensão de noções do cotidiano, daquilo que nos é comum. Tais elementos são rearranjados em novas composições, configurações espaciais, outros volumes e, neste caminho, nos desloca de maneira tão atraente que não há escapatória. Entre contrações e dilatações, esses objetos se conformam em novos ritmos, sugerem movimentos em cadeia e provocam o olhar a dançar por essas frequências.
A subversão do volume é central em muitas esculturas e instalações do artista, e através dela inversões ocorrem, onde o vazio toma corpo e o corpo material se desfigura. Em Snooker, obra conhecida de Damasceno, o artista apresenta uma mesa de sinuca coberta de fios de lã amarela, que se esparramam de duas luminárias suspensas sobre a mesa, brincando com a materialidade ao transformar a luz em matéria.
Em Método para arranque e deslocamento, obra do começo dos anos 1990 que ocupa uma sala sozinha, encontramos a perspicácia do artista ao trabalhar com o mínimo. A instalação é formada por recortes do carpete cinza aplicado sobre o chão de madeira da instituição, dos quais esculturas surgem nas extremidades da grande sala. O artista demonstra como o primeiro passo para a transformação do comum vem pelas ideias, e não só através de novas materialidades.
A experiência de quem visita a exposição José Damasceno: moto-contínuo é do tipo que é definida, em primeiro lugar, pelas escolhas de trajeto, como em todas exposições de livre percurso. Entre escolhas, é preciso definir o quanto nosso olhar para o cotidiano será afetado por tantos deslocamentos. Pode parecer irônico que uma reflexão a respeito da repetição gestual de nossos corpos venha justamente de obras que têm a repetição como sua base. Mas é justamente aí que encontramos a possibilidade de acordar para novas formas de olhar e viver no extra-ordinário.
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Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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Serviço:
José Damasceno: Moto contínuo
Curador responsável: José Augusto Ribeiro
Período: De 24.04.21 a 30.08.21
Pina Estação – 2° andar Largo General Osório, 66 – Santa Ifigênia De quarta a segunda, das 10h às 18h
Ingressos Gratuitos, com reserva exclusiva pelo site
Obs.: A agenda dos museus pode mudar de acordo com as diretrizes de contenção da pandemia. Consultar site para conferir os dias em que o museu abre.
Visitantes: o público terá a sua temperatura aferida, e quem estiver com temperatura acima de 37,2° e/ou mostrar sintomas e gripe/resfriado deverá buscar ajuda médica e não poderá acessar o museu. O uso de máscara será obrigatório em todos os espaços e durante toda a visita. Não será permitido tirar a máscara em nenhum momento, como por exemplo para fotografias/selfies. Os espaços terão álcool gel para a higienização das mãos, além de uma nova sinalização que indicará o sentido de circulação e o distanciamento mínimo de 1,5m entre pessoas.
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