As mais significativas associações fotográficas brasileiras começaram a surgir no Rio de Janeiro, a partir de 1919, com a fundação do Photo Club Rio de Janeiro, seguido pelo Photo Club Brasileiro, fundado em 1923. A primeira iniciativa em São Paulo foi a Sociedade Paulista de Photographia, mas suas atividades se restringiram ao período de 1926 a 1929, apresentando nesse tempo uma exposição pública, e a edição da revista “Sombras e Luzes”. Apesar de não ter vingado, esse primeiro movimento pode ter sido um bom ensaio para os paulistanos.
Na década de 1930 um grupo de apaixonados por fotografia se reunia informalmente na loja Photo-Dominadora, propriedade de Antônio Gomes de Oliveira e Lourival Bastos Cordeiro, então localizada na Rua São Bento, na região da Sé. Desses encontros surgiu a vontade de formalizar as atividades e experimentos fotográficos dos amadores, e então uma assembléia geral de fundação foi realizada na noite de 28 de Abril de 1939 no Edifício Martinelli, local que sediaria o clube em seus primeiros anos. No dia seguinte o Foto Clube Bandeirante, primeiro nome recebido, iniciaria suas atividades.
Desde o início o clube se via como um organismo de exploração em um campo ainda pouco reconhecido no universo das artes visuais. Dessa característica viria seu nome, apropriado das companhias exploratórias do período colonial. A missão do clube era inserir a fotografia nos circuitos artísticos e superar o preconceito da crítica brasileira sobre essa linguagem. Já em 1945 o clube ampliou seus horizontes com a criação do departamento de cinema, modificando seu nome para o atual Foto Cine Clube Bandeirante.
Todas as atividades empreendidas pelos integrantes eram momentos de troca e discussão acerca da fotografia artística, além de contribuírem para sua legitimação no campo das artes. O clube se tornou um espaço propício para que os fotógrafos explorassem diversas correntes concomitantemente.
O pictorialismo era o estilo predominante nos primeiros anos dos foto clubes brasileiros, incluindo o bandeirante. Amplamente difundido a partir do final do século XIX, o pictorialismo era um conjunto de técnicas que buscava aproximar a construção de imagens fotográficas aos aspectos visuais de técnicas tradicionais, como a pintura, por exemplo. O estilo envolvia uma série de manipulações no processo de revelação das imagens, e o intuito era conduzir a técnica como um processo artístico, não só mecânico. No clube de São Paulo destacaram-se as pesquisas de fotógrafos como Valencio de Barros, Ismael Alberto de Souza e Guilherme Malfatti.
As investigações do modernismo acerca das formas – e suas possibilidades de construção e desconstrução – começaram a ganhar força no clube paulistano no final da década de 1940, se estendendo por pelo menos mais duas décadas. Muitos trabalhos valorizavam as formas geométricas, manipulações de luz e sombra, e todos os elementos básicos para criar novos tipos de composições, como percebemos nos trabalhos de Eduardo Salvatore e Gertrudes Altschul, uma das poucas mulheres presentes nas primeiras décadas do clube.
A fotografia arquitetônica foi intensamente explorada por José Yalenti, Thomas Farkas e Gaspar Gasparian, nomes de peso para a fotografia nacional. Outra corrente marcante na história do foto clube é a fotografia abstrata, com diversos desdobramentos, inclusive na trajetória do premiado José Oiticica Filho.
O Foto Cine Clube Bandeirante foi também casa de Geraldo de Barros, entre tantos nomes importantes para a fotografia moderna. O artista que trabalhava em diversas mídias ganhou destaque com as fotoformas, seu procedimento artístico baseado em sobreposições geometrizadas, chegando a expor essa pesquisa no MASP em 1950.
É importante lembrar que esses fotógrafos não se prendiam a um único estilo e, ao longo de suas carreiras, contribuíram para o desenvolvimento de diversas correntes. Entre estes que se aventuraram em muitos caminhos, se destacando pela versatilidade, podemos citar: Marcel Giró, German Lorca, Kazuo Kahawara, Aldo de Souza Lima, João Bizarro Nave Filho, Rubens Teixeira Scavone, Ademar Manarini, Ivo Ferreira da Silva, Roberto Yoshida, Dulce Carneiro e Raul Eitelberg.
As exposições realizadas pelo foto clube foram cruciais para seu impacto no circuito das artes. O clube paulistano foi pioneiro ao realizar salões de fotografia em São Paulo a partir de 1942, aos moldes dos salões de arte, incluindo as premiações, almejando reunir produções fotográficas de diversos lugares do mundo. Em sua terceira edição, no ano de 1944, o Salão Paulista de Arte Fotográfica já apresentava trabalhos de oito países diferentes.
Uma importante conquista ocorreu em 1965, quando uma sala dedicada a fotografias foi criada na VIII Bienal de Arte Moderna. Este evento comprova o sucesso do foto clube em sua missão inicial de propagar a fotografia no sistema da arte, legitimando-a enquanto linguagem artística.
O legado do clube se reafirma a cada exposição que reúne trabalhos provenientes de suas atividades. Em 2015 o MASP realizou uma exposição trazendo um panorama do FCCB com 279 obras de 85 integrantes. A curadoria foi de Rosângela Rennó, que também incluiu na exposição 31 cartazes dos primeiros salões realizados, e trechos retirados dos boletins publicados pelo clube.
Recentemente o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) anunciou uma exposição exclusivamente dedicada aos experimentos fotográficos do Foto Cine Clube Bandeirante. A exposição “Fotoclubismo: Fotografia Modernista Brasileira, 1946-1964” tem abertura prevista para março de 2021, e promete apresentar cerca de 140 fotografias do acervo do museu. Esta será a maior exposição com trabalhos do FCCB no exterior, reforçando o impacto internacional da produção brasileira na fotografia moderna.
Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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Referências:
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/instituicao13707/foto-cine-clube-bandeirante-sao-paulo-sp
Exposição do MASP
https://masp.org.br/exposicoes/foto-cine-clube-bandeirante-do-arquivo-a-rede
Exposição do MoMA