Com curvas orgânicas e formas geométricas, estes estilos representaram períodos de otimismo na sociedade moderna. Na busca por novas linguagens estéticas em diálogo com o design, a Art Nouveau e Déco estimularam novos hábitos culturais e novas ideologias. O comportamento social urbano, atrelado à sensualidade e ao luxo, foi representado nesses estilos como formas simbólicas de afirmação à hegemonia das capitais financeiras, servindo também como referência para a arquitetura de países em desenvolvimento.
Formado originalmente na Bélgica, o estilo Art Nouveau foi um movimento artístico decorativo iniciado pela burguesia, sendo estabelecido posteriormente em diversas cidades pela Europa e pelo mundo. O termo Art Nouveau, não foi usado à toa, de origem francesa, que significa “Nova Arte”, o movimento tinha como propósito revolucionar todos os âmbitos que envolvessem a cultura moderna; a arquitetura, o design, as artes, a moda e o design gráfico; todos foram influenciados por essa nova linguagem.
No período de sua criação, o ocidente passava pela segunda onda da Revolução Industrial, onde a padronização e a velocidade se tornaram prioridade para suprir a demanda dos moradores da cidade. No entanto, a criatividade e rigor técnico dos artesãos começaram a ser desvalorizados, sendo substituídos por móveis sem um acabamento refinado e de baixo valor. Indo contra a formatação industrial e mostrando o valor do trabalho artesanal, o movimento tinha também como propósito desafiar o conservadorismo das artes, que via o período neoclássico e as belas artes – pintura e escultura – como superior ao artesanato.
Influenciados pelo arquiteto francês Eugène Viollet-le-Duc (1814 – 1879) e o designer britânico William Morris (1834 – 1896) – fundador do movimento Art and Crafts – o movimento Art Nouveau foi elaborado por um grupo de artistas nomeado como Les Vingt, que desejava criar uma “obra de arte total”, reunindo as artes e o artesanato em uma unidade estética. Para eles, era tempo de erradicar o formalismo e historicismo da arte do século 19 e criar uma nova forma que fosse mais adequada à modernidade. Entre os nomes que se destacaram neste grupo, os arquitetos Hector Guimard (1867 – 1942), Victor Horta (1861 – 1947), Ernest Delune (1859 – 1945) e o ilustrador Aubrey Beardsley (1872 – 1898), criaram projetos que impressionaram o público, tornando-se um dos principais estilos na virada do século.
Reconhecida por utilizar o uso assimétrico das formas, linhas longas que induzem o movimento e organicidade, os artistas encontraram nas curvas sinuosas de plantas e insetos inspiração para os seus trabalhos. Consideradas como características que definem o estilo do movimento, as curvas e formas orgânicas podem ser encontradas em diversas áreas, desde decoração de interiores e prédios até ilustrações. Como inspiração, a nova proposta encontrou na arte medieval, na arte popular, na arte japonesa e no estilo rococó elementos que formavam uma correlação harmoniosa, formando uma ponte entre o clássico e o moderno.
Entre as características da Art Nouveau, a obsessão pela representação da forma feminina chama a atenção. Os artistas se inspiraram demasiadamente nas curvas e no corpo, tendo um apelo sensual e a objetificação da mulher em suas obras. Tal questão pode ser observada nos cartazes criados pelo artista tcheco Alfons Mucha (1860 – 1939), nas obras inspiradas no simbolismo mitológico grego do pintor austríaco Gustav Klimt (1868 – 1918) e no filme “Klimt”, de 2006.
Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o movimento foi perdendo a sua força. Com o desencanto pelo florescer da modernidade e o declínio das classes sociais, as ideias do movimento tornaram-se um pensamento utópico, um fenômeno efêmero da Belle Époque. Porém, entre 1960 e 70, o movimento retornou ao campo cultural com a Pop Art, a Op Art e com os hippies, que utilizaram a estética Nouveau como inspiração no movimento Flower Power, ficando definida como “Art Nouveau on Acid”. O feminino novamente, atrelado a curvas e cores psicodélicas foram utilizadas em pôsteres do movimento.
No Brasil o estilo pode ser visto em alguns pontos turísticos: em São Paulo, o viaduto da Santa Efigênia, no Rio de Janeiro, a Confeitaria Colombo e em Manaus, o Teatro Amazonas. Vários dos seus monumentos fazem parte da lista de Patrimônio da UNESCO, fato que comprova a importância desse movimento.
Art Déco é um estilo que desenvolveu-se no design e na arquitetura nos anos 20. Embora já tivesse aparecido na Bélgica e na França antes da Primeira Guerra Mundial, o movimento foi oficialmente apresentado ao mundo em 1925. Com a sua estreia na Exposição Internacional de Artes Decorativas e Industriais Modernas de Paris, com o nome Art Décoratifs (Artes decorativas, em francês), o nome foi abreviado para Art Déco. Para os franceses, esta nova linguagem seria uma forma de inspiração e esperança para Europa pós-guerra, tendo como uma busca um futuro próspero.
Além da Europa, ela foi aceita pela sociedade ocidental, especialmente pelos ricos e a classe média alta, que ansiavam por um futuro com luxo em demasia. O estilo se tornou popular em teatros, cinemas, transatlânticos, estações de trem, prédios comerciais, prédios públicos e na arquitetura dos arranha-céus em Nova York. Ele ainda causou impacto no design de joias, talheres, moda, publicidade, cinema, carros e objetos do dia-a-dia, como rádios e aspiradores de pó.
Comparada com os movimentos modernistas que estavam surgindo, a Art Déco foi uma expressão decorativa e simbólica, marcada por uma mistura de estilos e diferentes ornamentações. Esse estilo adotava como referência o uso de formas geométricas, longas linhas em ângulos retos e o alongamento das formas. Muitos estilos e movimentos artísticos a influenciaram, como a geometria do Cubismo e De Stijl, as formas energéticas do futurismo e do construtivismo. O Déco também se inspirou na arte egípcia, mesopotâmica e asteca, bem como na Antiguidade Clássica.
Por ser uma época em que a economia estava em alta, com o estilo americano “Roaring Twenties” e o francês “Joie de Vivre” tomando a cena no otimismo social, as pessoas ansiavam por carros velozes, viagens e festas noturnas ricamente decoradas ao som de jazz. Esse estilo de vida pode ser visto nas obras de uma das mais famosas artistas do Art Déco, a pintora polonesa Tamara de Lempicka (1898 – 1980). Suas pinturas são marcadas por formas cilíndricas, angulosas e volumosas que exaltam a elegância e o caráter urbano da elite da época. Nas ilustrações, o artista russo Romain de Tirtoff (1892 -1990), conhecido pelo pseudônimo Erté, também retratou o luxo do período através principalmente dos códigos de vestimenta. Novamente, a mulher torna-se personagem recorrente nessa linguagem.
No entanto, com a quebra da bolsa americana em 1929, e o efeito da Grande Depressão que se instalou na década de 30, a Art Déco entrou em uma fase marcada por limitações econômicas. O estilo tornou-se mais contido, simplificado e rígido, resultando em um novo estilo arquitetônico, o Streamline Moderne. Com um design aerodinâmico, ele foi caracterizado por edificações baixas com longas linhas horizontais, feitas com superfícies lisas e polidas. Utilizando também materiais mais acessíveis, como cromo, aço inoxidável e plástico. Nesta época, os EUA substituíram a França como líder do estilo. Após a eclosão da Segunda Guerra Mundial, a popularidade da Art Déco e sua vertente enfraqueceram, dando lugar ao modernismo voltado para o funcional e o minimalista. No entanto, o estilo foi revisitado por designers e arquitetos nas últimas décadas, inspirando artistas e arquitetos nos anos seguintes.
Hoje, é possível encontrar diversos edifícios em todo o mundo cujo interior evoca o estilo luxuoso da Art Déco, como o edifício Chrysler e o Empire States em Nova York. Na literatura e no cinema, “O Grande Gatsby”, obra do autor americano F. Scott Fitzgerald (1896 – 1940) é uma referência que retrata o período da década de 20 americana. No Brasil, é possível encontrar diversos monumentos feitos no estilo Déco: no Rio de Janeiro, o Cristo Redentor e a estação Central do Brasil; em São Paulo, o edifício Altino Arantes (inspirado no Empire States) e o Estádio do Pacaembu, além do elevador Lacerda em Salvador. No entanto, uma cidade destaca-se em colecionar o maior acervo de monumentos dessa linguagem, a cidade de Goiânia.
Projetada na década de 1930 para ser a nova capital de Goiás, sua criação estava atrelada com a Marcha para o Oeste, política que promovia o desenvolvimento e ocupação do Centro-Oeste brasileiro. O projeto da nova capital tinha como intuito representar a modernidade e a sofisticação, deixando para trás o estilo colonial, presente nas primeiras cidades do país. O arquiteto urbanista Attilio Corrêa Lima (1901 – 1943) foi o encarregado do projeto da nova capital, com formação em urbanismo pela universidade de Paris, o estilo europeu teve grande influência em seus projetos.
Mesmo sendo duas linguagens que orbitam entre a arquitetura e os hábitos culturais, elas apresentam diferenças que definem as suas personalidades. Uma se inspira na natureza, nas linhas curvas e sem um padrão definido, o outro, segue por um caminho rígido, simétrico e industrial, buscando a perfeição pela proporcionalidade.
Evidentemente, tanto a Art Nouveau quanto a Art Déco utilizaram do industrialismo como meio, no entanto o Nouveau transita em uma correlação entre o natural e o industrial, criando uma simbiose com o que provém da natureza atrelado a criação humana. Já o Déco rompe com esses elementos, abdicando da origem orgânica, evidenciando o advento de novas tecnologias fabris.
Nas temáticas que convergem, ambos propuseram uma maneira de unir a arte e a indústria, encerrando, até certo ponto, o conflito entre os termos “artista” e “artesão”. A imagem da mulher também é bem definida nos dois estilos, colocando-a como personagem central, de forma objetificada; no primeiro, uma referência direta ao prazer, no segundo, atrelada como parte dos bens de luxo e de consumo. Junto com a luxuosidade e períodos de economia em alta, estes estilos celebraram a chegada da modernidade e da urbe no espaço social.
Carlos Gonçalves é graduando em Jornalismo pela PUC-SP, com pesquisa científica em crítica de arte.
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1 Comment
Excelente texto esclarecendo as diferenças desses estilos nascidos no séc. XX.