Waltercio Caldas. Crédito foto: Leo Eloy/Estúdio Garagem, cedida pela Fundação Bienal de São Paulo
A 33a Bienal de São Paulo tem como título Afinidades Afetivas. Seu curador, Gabriel Pérez-Barreiro, foi curador da 6a Bienal do Mercosul (2007), é espanhol, formado em História e Teoria da Arte no Reino Unido e vive em Nova Iorque, onde é o responsável pela direção e curadoria da Coleção Patrícia Phelps de Cisneros (Nova Iorque e Caracas).
O conceito curatorial indica a articulação entre duas obras literárias. A primeira, de Goethe, “Afinidades Eletivas” (1809) que, em resumo, trata das aproximações entre vida emocional dos indivíduos e a atividade dos elementos do mundo natural. A segunda, a tese de Mário Pedrosa, defendida na Faculdade Nacional de Arquitetura do Rio de Janeiro, “Da natureza afetiva da forma na obra de arte” (1941), que estabelece relações entre os elementos formais das obras de arte e a estrutura psicológica do observador a partir da Psicologia da Gestalt, na busca de compreensão sobre a experiência estética. Vale lembrar que Pérez-Barreiro foi, com a brasileira Michelle Sommer, responsável pela mostra “Da natureza afetiva da forma” (2017) realizada no Museo Nacional Reina Sofia, em Madrid, sobre a produção intelectual de Mario Pedrosa, sendo portanto, a obra deste autor um interesse claro em sua perspectiva curatorial.
Para desdobrar essa articulação entre obras distantes, Pérez-Barreiro opera sua proposta de Afinidades Afetivas na 33ª bienal de São Paulo, enfatizando o caráter das exposições como experiência e, segundo o curador, não como declarações. Nesse sentido, as plataformas discursivas da edição destacam uma diferenciação com as anteriores, já que propriamente o título não determina um tema mas uma pré-disposição com a qual se trabalha: a de que o evento é uma soma de trabalhos individuais que exalta particularidades de cada um dos artistas presentes e uma compreensão específica e pessoal dos visitantes em relação ao exposto.
Esse caráter da exposição como experiência se configura, do ponto de vista curatorial além de educacional, como a oferta de uma série de exercícios de atenção (como exemplo no próprio guia da exposição) que propõem certo isolamento e tentativas de mergulho concentrado nas obras. Nessas premissas está presente algo muito divulgado em entrevistas em torno da mostra, a de que haveria uma alteração, a partir desta 33a edição da Bienal, do papel curatorial e dos sentidos das bienais de arte, modelos que necessitam ser reconfigurados.
Para efetivar essa edição a partir desse mote, foram convidados sete artistas para a equipe curatorial – os brasileiros Sofia Borges e Waltércio Caldas; Antonio Ballester Moreno, Alejandro Cesarco, Claudia Fontes, Wura-Natasha Ogunji, Mamma Anderson – que organizaram exposições independentes nas quais suas próprias obras estão incluídas relacionadas com as de outros artistas, apontando assim a noção de ‘afinidades afetivas’ que o título propõe.
Além dessas exposições dentro da grande exposição da 33ª bienal de São Paulo, instalada no pavilhão do Parque do Ibirapuera, Pérez-Barreiro escolheu doze outros projetos individuais de artistas escolhidos, sem relação entre si. Dentre esses, vale apontar para a relevância da sala de Siron Franco, que apresenta a produção relacionada ao acidente radioativo com o césio 137, ocorrido em Goiânia, em 1987. Uma tragédia anunciada, que o artista denunciou desde aquela década. Outras apresentações dignas de nota são as exposições curadas pelos artistas brasileiros, Sofia Borges e Waltércio Caldas. A primeira, com “A infinita história das coisas ou o fim da tragédia do um”, relaciona fotografias, desenhos, pinturas a partir do eixo do inconsciente/primitivo. Caldas apresenta uma exposição – “Os aparecimentos” – com importantes nomes da arte ocidental que, de maneira geral, refletem sobre a linguagem visual e comentam as produções históricas, em conformidade com a própria obra do artista curador.
Mirtes Marins de Olivera é pesquisadora do PPG Design da Universidade Anhembi Morumbi. Crítica e curadora independente.
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