Outros circuitos para a arte: Expandindo os circuitos tradicionais da arte
Afirmando seu vínculo com a arte, o shopping Pátio Batel promove em setembro, mês em que completa seis anos de atividades, a exibição do site-specific “Planos-Pipa”, do artista carioca Marcelo Jácome. Monumental e efêmera, esta estrutura composta por cerca de 1.500 pipas coloridas, já foi apresentada em importantes espaços de exposição, tais como a Saatchi Gallery, em Londres, Art Basel, na Basileia e Jardin D´Acclimatation, em Paris.
Pelo segundo ano consecutivo, o shopping situado em Curitiba, propõe a seus freqüentadores o contato com obras contemporâneas de grandes dimensões. Em 2018, a intervenção escolhida para ativar o átrio central, foi elaborada pelo artista Jason Hackenwerth,(EUA) a partir da utilização de 15 mil balões. A segunda proposta de ativação, tem como objetivo consolidar o compromisso do Pátio Batel com a arte contemporânea. Relação esta, que é revelada, pela presença, nos espaços do shopping, de obras de artistas e designers como Arthur Lescher, Klaus Schneider, Martin Ogolter, Guita Soifer, Geraldo Leão, Hugo França e Sérgio Rodrigues; bem como pela existência de uma galeria multimídia, destinada à exposições temporárias.
Segundo Mariane Kucinski Caponi, gerente de marketing do Pátio Batel, o interesse em aproximar o público da arte faz parte do próprio conceito do shopping, desde o princípio de suas operações. Neste sentido, comenta que a decisão estava presente “desde a escolha do projeto arquitetônico, em valorizar os espaços, a luz que se transforma ao longo do dia”.
“Planos-Pipa”, obra selecionada pela curadora Eneida Gouvêa Vieira, para ocupar temporariamente o amplo átrio de 400 m2 e 25 metros de altura, dialoga com esta proposta. Se direciona à uma pesquisa dos materiais e da cor. Segundo ela, “Uma experiência visual pura cuja cor é matéria e escultura”. Em seu uso das pipas, o trabalho de Marcelo Jácome, também revela um pensamento sobre o espaço, seus modos de ocupação e ativação.
Em entrevista à plataforma Artsoul o artista identifica, desde suas primeiras colagens e experimentações como papel, a aproximação de algumas destas questões: “Comecei fazendo sobreposições de camadas, em cortes de compensado de madeira gigantes, de modo que eu passei a entender, e a perceber, que criava espacialidades dentro daquele suporte bi-dimensional.”.
O interesse pelas pipas surge, segundo o artista, como possibilidade plástica, diante do desejo de “passar esses papéis e essas cores para o espaço, de uma maneira mais contundente”. Jácome destaca também a influência, em seu processo de criação, do ambiente urbano, sobretudo dos gigantescos espaços vazios da região portuária do Rio.
É em uma antiga fabrica desativada, transformada em ateliê, que tem início a pesquisa com pipas e papéis de seda, que se desdobra na concepção do site-specific “Planos-Pipa”. Ao pensar o percurso que o levou à esta elaboração, ao uso das pipas e ao trabalho com sua “carga cromática escandalosa”, o artista esclarece: “Eu sempre me interessei muito por cor, quer dizer, sempre fazia um recorte do mundo através da cor […] costumava enxergar a cidade, a paisagem, a partir de massas cromáticas”. A experiência dos deslocamentos na cidade, a profusão de estímulos visuais e gráficos, presentes nos lambe-lambes, também são mencionados como influências neste processo criativo.
Em outros trabalhos como “Multiedros Relacionais”, “Pontos Suspensos”, assim como nos “Planos- Pipas”, um certo jogo entre o bi-dimensional e o tridimensional é estabelecido. A formação do artista em Arquitetura é elemento importante para sua produção como artista plástico. Seus procedimentos, particularmente os modos de abordar o espaço e as possibilidades construtivas dos materiais, são marcados por um intenso diálogo entre arte e arquitetura.
Expandindo os circuitos tradicionais da arte, a tendência recente de exibição de obras em shoppings centers e centros comerciais, tem como bons exemplos, no contexto brasileiro, as diversas iniciativas de constituição de coleções privadas, abertas ao público, em shoppings de São Paulo, tais como os da rede Iguatemi em exposições interativas e imersivas como “Paisagens de Van Gogh”, apresentada atualmente pelo Shopping Pátio Higienópolis. Enquanto experiência de projeção internacional, destaca-se a mostra do importante artista contemporâneo Ai Weiwei, na galeria comercial “Le Bon Marché”, em Paris.
No entanto, diante desta tendência, é interessante mencionar, que estas iniciativas também encontram resistências entre alguns artistas. Sobre a experiência com a arte promovida pelo Pátio Batel, Mariane Kucinski Caponi comenta o papel fundamental do curador em mediar essa relação com o artista, em fazer esse “meio de campo”, percebendo, finalmente, “que muita gente já tem visto com bons olhos a presença de obras de arte em shoppings centers”, inclusive pela possibilidade de alcançar outros públicos, distintos daqueles que visitam os museus. Ao observar as relações cotidianas dos freqüentadores do espaço com as obras comenta que o mais interessante “da arte no shopping é o inesperado. Ele acontece quando você simplesmente veio aqui para almoçar, ou para comprar um presente e se depara com uma obra de arte que te faz bem”.
Estas observações também se aproximam, em certa medida, do interesse demonstrado por Marcelo Jácome, em ter sua obra exibida em um espaço de grande circulação de pessoas. Na perspectiva do artista é “fundamental, sair dessas histórias, do formatado, ali. Que tudo bem, tem que existir. Mas tem também que botar pra fora, ir para os lugares que não são apenas voltados para a arte, estar na rua mesmo. Tem pessoas passando aqui. As pessoas têm que ter contato com isso. Quanto mais artista na rua melhor. Tem que fazer, na rua, no shopping, na esquina, no bar, onde for.”
Anna Luísa Veliago Costa é Mestre pelo Programa de Pós-graduação Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo, é graduada em História pela mesma universidade, com intercâmbio acadêmico na Universidade Sorbonne-Paris IV.
Conheça os nossos artistas, ou para saber mais do universo da arte contemporânea, leia em nosso Blog: “Identidades imaginadas e gestos de resistência na arte indígena contemporânea“.