Se a cidade de São Paulo já era conhecida como a capital cultural do país, nos últimos anos ela tem dado ainda mais motivos para receber esse título. A metrópole cresce a cada ano e, acompanhando esse movimento, os museus e espaços de arte buscam expandir seus locais de atuação e responder à demanda de novos públicos. Neste ritmo de efervescência artística e valorização das instituições e galerias, alguns bairros têm se consolidado enquanto verdadeiros polos de cultura. Confira, a seguir, uma seleção dessas regiões.
A mais famosa avenida da cidade é, talvez, o lugar mais lembrado quando se pensa em museus de artes plásticas e visuais. Ela abriga instituições clássicas, como o Masp e o Itaú Cultural, que dispõem grandes acervos de obras nacionais e internacionais, mas também tem recebido novas galerias e espaços de arte que atendem outros tipos de público. Da altura do Paraíso até a Consolação, é possível traçar um roteiro de visitas pelos diferentes edifícios que a avenida apresenta:
Na Japan House, uma instituição criada pelo governo do Japão, uma instalação de arte composta por encaixes de madeira Hinoki chama atenção de quem caminha pela Avenida. Com o objetivo de difundir “todos os elementos da genuína cultura japonesa para a comunidade internacional”, o local apresenta três andares de espaço expositivo, com obras que exploram arte, design, gastronomia e tecnologia. Inaugurada em 2017, foi a primeira unidade do projeto a abrir suas portas, seguida das sedes de Londres e Los Angeles.
Do outro lado da rua, ao lado do Sesc Paulista, o Itaú Cultural apresenta uma extensa programação voltada para a pesquisa e a produção de manifestações artísticas e intelectuais. Há 35 anos, a organização promove diversas exposições, shows, espetáculos, filmes e cursos, incentivando a criação e o consumo de arte no país. Além das mostras temporárias exibidas no edifício, possui, ainda, um acervo permanente, a “Brasiliana Itaú”, com trabalhos que fazem parte da imensa coleção de obras do banco Itaú.
Mais à frente, sentido Consolação, o MASP aparece quase como parada obrigatória para quem visita o corredor cultural da Av. Paulista. Seu edifício, projetado por Lina Bo Bardi no final da década de 1960, tornou-se um ícone da arquitetura do século XX e um marco para toda a cidade. O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand foi o primeiro museu moderno do país e, atualmente, possui uma coleção de mais de 11 mil itens, dentre pinturas, esculturas, fotografias e objetos, incluindo produções de outros continentes, como África, Ásia e Europa.
Mais recentemente, inaugurado em 2017, o prédio do Instituto Moreira Salles se tornou uma das vistas mais famosas da avenida. Com 9 andares, o IMS conta com grandes salas expositivas, uma biblioteca referência em fotografia e um cineteatro, onde acontecem sessões de filmes, seminários, debates e eventos musicais, promovendo a difusão de um extenso acervo nas áreas da fotografia, iconografia, literatura e música.
Já na esquina com a Av. Angélica, integrando este corredor cultural, a galeria Gomide&Co inaugurou sua nova sede, que marca seus dez anos de atuação na cidade. Com grande relevância no mercado nacional e internacional, tem conquistado cada vez mais destaque no circuito artístico do país, participando de feiras e apresentando um rico calendário expositivo.
Localizada na Rua Minas Gerais, bem próxima à Av. Paulista, a galeria Vermelho tem suas portas quase escondidas pelos estabelecimentos que a cercam. Seu interior, no entanto, não é nada tímido: projetada em conjunto com Paulo Mendes da Rocha, a galeria possui 4 salas expositivas, um espaço ao ar livre e uma fachada de 120 m2. Fundada em 2002, já representou diferentes gerações de artistas da América Latina e segue expandindo sua atuação no mercado através da participação de feiras e da produção de importantes mostras.
Ao lado do cemitério da Consolação, em Higienópolis, uma pequena vila também tem conquistado o mercado da arte. Desde 2020, algumas galerias têm desenvolvido seus projetos nos sobrados de tijolo aparente da Travessa Dona Paula. O Projeto Vênus, escritório de arte dirigido por Ricardo Sardenberg, A Gentil Carioca, galeria do Rio de Janeiro que agora tem sua sede em São Paulo, e a Coleção Moraes-Barbosa, que fomenta pesquisas e promove exposições, são espaços que têm movimentado a vila e contribuído com a agitação do bairro.
Mais adiante, próxima à Praça Rotary, a Galeria Jaqueline Martins é mais um espaço que se destaca no cenário da arte contemporânea. Desde 2011, atua com estratégias curatoriais colaborativas, produzindo diálogos entre diferentes perspectivas e gerações de artistas.
O centro histórico de São Paulo é marcado tanto por galerias já estabelecidas no mercado, quanto por projetos independentes mais recentes, que surgiram nos últimos anos e já ganharam notoriedade no circuito. Entre um e outro, as regiões da República e do Anhangabaú mostram como a arte pode se firmar no centro da cidade, para além das empenas dos prédios, e como edifícios históricos podem abrir portas para o futuro.
No Edifício Copan, um dos ícones da arquitetura paulistana, o Pivô já é tradicional. Fundado em 2012, é uma organização sem fins lucrativos que trabalha com pesquisa e experimentação artística, promovendo exposições, projetos comissionados ou públicos, residências para artistas e publicações. Com parcerias institucionais e apoio de diversos agentes, o Pivô se mantém como referência de um local que aproxima o público da produção criativa.
Já no Edifício Louvre, na Av. São Luís, a Verve trabalha criando diálogos entre produções de artistas jovens e consagrados, compreendendo seus processos criativos como construções complementares. A galeria explora pintura, desenho, gravura, fotografia e performance, e procura estabelecer relações com o prédio em que se insere, um patrimônio paulistano.
A Central, por sua vez, é uma galeria instaurada no subsolo do IABsp, o instituto de arquitetos de São Paulo. Ela representa artistas cuja poética gira em torno das questões da arquitetura e do urbanismo, explorando a relação dos indivíduos com o espaço urbano. Entre 1940 e 1960, o espaço da Central abrigava o “Clubinho de Artistas”, que na época se tornou um ponto de encontro entre artistas e intelectuais.
Saindo da República e chegando na região do Anhangabaú, existe um outro prédio histórico que se voltou para a cultura – o Edifício Vera. Construído na década de 1950 e tradicionalmente comercial, o imóvel passou por uma série de reformas recentes e foi reaberto, em 2021, com salas de escritório e um centro cultural que contém espaços expositivos, ateliês e uma biblioteca.
Outra iniciativa que surgiu nos últimos anos e já conquistou um espaço importante na cidade é a Galeria Reocupa, da Ocupação 9 de Julho. Próxima às regiões do Bixiga e da Bela Vista, localizada no antigo prédio do INSS – que ficou abandonado durante 3 décadas, até ser ocupado pelo MSTC (Movimento Sem Teto do Centro) –, a galeria promove exposições com obras de artistas que moram na ocupação, além de artistas emergentes e mais consolidados no circuito. Vale lembrar ainda que, neste ano, a Ocupação 9 de Julho participa da 35ª Bienal de São Paulo.
Um clássico paulistano, a Pinacoteca de São Paulo é o museu de arte mais antigo da cidade. Voltada para obras nacionais produzidas desde o século XIX até a contemporaneidade, possui um extenso acervo de cerca de 11 mil peças, com trabalhos importantes para a história da arte do Brasil, e abrange três edifícios: a Pinacoteca Luz, em frente à histórica Estação da Luz; a Pinacoteca Estação, localizada ao lado da Sala São Paulo, no Complexo Cultural Júlio Prestes; e a Pinacoteca Contemporânea, que foi inaugurada no início deste ano, no Parque da Luz, virada para a Av. Tiradentes.
No mesmo edifício da Pina Estação, fica localizado o Memorial da Resistência, um museu que preserva as memórias da repressão e da luta contra a ditadura civil-militar. O memorial ocupa o edifício onde funcionou, entre 1940 e 1983, o Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops/SP), uma das polícias políticas mais violentas do regime ditatorial. Além das salas que guardam a história da prisão política, dos documentos e de relatos de sobreviventes, o Memorial realiza, ainda, exposições temporárias que dialogam com diferentes temáticas relacionadas aos direitos humanos e à repressão política.
Já nos arredores da Estação Tiradentes, na Rua Três Rios, fica a Casa do Povo. Fundada em 1947 por parte dos judeus progressistas que viviam no bairro do Bom Retiro, foi criada com o intuito de preservar a cultura judaica na cidade. Abrigou o Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleichem e o Teatro de Arte Israelita Brasileiro (TAIB), que na década de 1960 se tornou um local de resistência contra a ditadura civil-militar. Atualmente, a Casa do Povo se estabelece como um “monumento vivo”, isto é, que não apenas armazena um acervo fixo, mas que mantém a história viva a partir de diversas atividades.
Não é de hoje que o bairro de Pinheiros é conhecido como uma área cultural da cidade. Famoso pela variedade de restaurantes, bares, livrarias, cinemas e teatros, ele reúne também uma série de museus e galerias importantes.
No Instituto Tomie Ohtake, há um grande calendário de exposições de artistas nacionais e internacionais, além de uma ampla programação ligada ao debate e ensino de arte contemporânea. Seu prédio, inaugurado em 2001, é uma homenagem à artista Tomie Ohtake, sendo um dos raros espaços da cidade que teve seu projeto arquitetônico pensado especialmente para receber mostras de arte, design e arquitetura.
A menos de 1 km de distância do instituto, é possível visitar outras galerias bastante relevantes no cenário artístico. A Millan, na Rua Fradique Coutinho, foi fundada em 1986 e consolidou-se como referência por promover artistas e apoiá-los a participar de grandes exposições nacionais e internacionais. Já a Galeria Estação, fundada em 2004, lançou um programa curatorial que atende artistas contemporâneos emergentes e autodidatas pioneiros, apresentando um grande leque da arte nacional.
O Museu da Casa Brasileira, por sua vez, tem como foco a morada no Brasil, vista sob o viés do design e da arquitetura. Localizado na Av. Faria Lima, o museu fica próximo a outras três instituições que ocupam a avenida principal do Jardim Europa: o Museu Brasileiro da Escultura e da Ecologia, o Museu da Imagem e do Som e a Casa Museu Ema Klabin. Juntos, formam um destino cultural para a vizinhança, cada um com sua especialidade – o MuBE interligando escultura, ecologia, arte e ciência; o MIS ligando o audiovisual, a música e a imagem; e a Casa Ema Klabin transformando uma residência dos anos 50 em museu aberto ao público.
O bairro dos Jardins vem crescendo, pouco a pouco, como um reduto das artes visuais. Lembrado por abrigar galerias tradicionais do mercado, ele tem recebido cada vez mais propostas para movimentar o circuito cultural da metrópole. A Vila Modernista, por exemplo, foi projetada em 1938 pelo artista e arquiteto Flávio de Carvalho e, atualmente, é habitada por galerias que tentam resgatar e preservar sua memória, além de promover exposições inovadoras no local.
Além dessa, outras iniciativas colaboram com a diversificação de espaços na região, como a galeria Choque Cultural, que foi fundada em 2004 e se tornou referência em arte urbana dentro e fora do Brasil. Apresentando artistas jovens e consagrados, ela trabalha com mídias diversas e exposições indoor, nas ruas e no ambiente virtual. Oferece, ainda, programas de intercâmbio, residência, colaborações e intervenções urbanas.
A Zipper Galeria, inaugurada em 2010, se destacou por trabalhar com artistas emergentes e ficou conhecida por lidar com a “linguagem jovem” da cidade. Com o passar dos anos, grandes nomes das décadas de 1980 e 1990 foram inseridos, combinando a maturidade desses artistas com a abertura discursiva dos mais jovens, configurando uma galeria ainda mais plural.
Com grandes galpões, casas geminadas e prédios de poucos andares, a Barra Funda tem sido notada por profissionais das áreas da arte, do design e da gastronomia. Seguindo o movimento da região vizinha, a Santa Cecília, a Barra Funda tem se estabelecido como um efervescente polo cultural de São Paulo, atraindo cada vez mais bares, restaurantes e ateliês de arte.
Embora esse fluxo tenha se intensificado nos últimos anos, algumas galerias habitam a Barra Funda há mais de uma década. O Ateliê 397 é um espaço independente de arte que, em 20 anos de existência, trabalha com experimentação artística e cursos de formação. Produzindo uma série de exposições e eventos, o ateliê revela novos artistas ao mercado e cria uma rede de trocas de experiências e repertórios.
A Fortes D’Aloia & Gabriel, também há mais de uma década na Barra Funda, consolidou-se como uma das principais galerias de arte contemporânea do Brasil e do exterior. Localizada em um galpão de 1.500 m2, ela mantém uma programação com cerca de 15 exposições por ano. Já a Mendes Wood DM, outra galeria com grande inserção no mercado internacional, manteve sua sede no bairro dos Jardins durante 11 anos, até se mudar para a Rua Barra Funda, em 2021.
Também nova no bairro, a Usina Luís Maluf surgiu como um espaço de fomento à cultura, com programas de residência para jovens artistas e mostras de arte. Em um grande galpão na Rua Brigadeiro Galvão, a ULM pretende manter diversas atividades como ações educativas, exposições e projetos voltados à população local. Nesta mesma rua, a Hoa Galeria inaugurou, em fevereiro deste ano, sua nova sede. Ela é a primeira galeria de propriedade e direção negra do Brasil e tem ênfase na produção de pessoas racializadas. Com uma perspectiva decolonial da arte contemporânea, trabalha com diversos suportes, desde a pintura até o 3D. Já a GDA (Galeria de Artistas), na Rua Barra Funda, é uma iniciativa formada, como o próprio nome diz, por um grupo de artistas. Ela funciona como uma espécie de plataforma para expor e fazer circular os trabalhos dos integrantes, além de abrir espaço para pesquisas e debates para testar outras maneiras de inserção no mercado de arte. Bem próximo a ela está o espaço Bananal, também proposto por artistas e educadores. Ele funciona como um local interdisciplinar, com o objetivo de manter diálogos entre cultura, formação, território e comunidade.
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