Bruno Simões (São Paulo, 1982) possui uma atuação plural como fotógrafo, jornalista, arquiteto, designer, curador, educador e empresário – construindo uma carreira internacional no ciclo da economia criativa. Há uma década fundou o Ateliê Bruno Simões e a Feira MADE (Mercado. Arte. Design), na qual é responsável também pela curadoria e cenografia. Atualmente é o Curador-Geral oficial do Brasil para a ApexBrasil – Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos. Bruno atua como Conselheiro Administrativo da UPC – Universidad Peruana de Ciencias Aplicadas (Lima) e do Instituto Bardi/Casa de Vidro – órgão de preservação do legado deixado por Lina Bo Bardi e Pietro Maria Bardi no qual também responde como Presidente da Sociedade de Amigos Bardi.
Artsoul: Para começar a conversa, pode nos contar um pouco da sua atuação no campo do design? Você é graduado em Arquitetura e Urbanismo, além de Fotografia. Em qual momento o design autoral passou a ter centralidade na sua vida profissional?
Bruno Simões: Já durante a faculdade eu via a arquitetura como uma disciplina completa e o design fazia parte de meus interesses, mesmo não sendo algo abordado no curso. Foi justamente essa visão mais ampla que me permitiu trabalhar na Triptyque, onde isso foi elevado à décima potência porque lá o pensamento de arquitetura era de vanguarda e o mobiliário precisava acompanhar essa lógica. Nesse momento aumentei meu interesse pela área e passei a seguir a vanguarda do design internacional com muito entusiasmo.
Foi justamente esse link que criei naturalmente entre arquitetura e design que me levou a aceitar a vaga de editor na revista Casa Vogue, pois eu acreditava que seria uma maneira de explorar essa simbiose em maior profundidade – eu me interessava pelas histórias por trás de cada criação e nunca vi o mobiliário pelo viés estético ou funcional, pra mim era um campo de pesquisa fascinante do processo criativo e de fabricação. Via o design como uma ferramenta comportamental.
Então acho que foi esse período em que de fato mergulhei no mundo do design autoral, pois tive a chance de conhecer e entrevistar personagens do mundo todo que me empolgavam e cujas histórias eu sentia muita vontade de compartilhar. Se tornou uma obsessão e daí em diante fui me envolvendo cada vez mais em projetos voltados à área.
Artsoul: O termo “design” é um coringa para muitas coisas. Pode nos contar um pouco sobre quais ramos do design você tem mais foco?
BS: Meu interesse no design sempre foi pelo personagem, não acredito no design desassociado do criador. Justamente por isso sempre defendi o uso do termo design autoral e sentia a necessidade de educar o mercado brasileiro que até então não se preocupava com essa valorização do profissional. Um desenho interessante só surge desse local de curiosidade e investigação que em muito se aproxima do universo das artes. Nesse sentido também organizei no Brasil a vanguarda do movimento do design-arte ou colecionável. Minha intenção era usar este vasto repertório do mercado de artes plásticas como metodologia para um design que emocionasse as pessoas e provocasse o desejo por formar coleções, mais do que simplesmente consumir por impulso de tendências.
Artsoul: Se compararmos o mercado de design autoral brasileiro com o de outros países, o que você poderia destacar de especial na produção nacional?
BS: São muitos os aspectos que podem ser destacados, mas um em especial que acho bastante relevante é o da nossa relação histórica com a madeira. Desde a exploração criminosa do período colonial (e seu reflexo alarmante até os dias de hoje) nosso design se conectou à essa matéria prima, justamente o que levou o design moderno brasileiro a extinguir o Jacarandá da Bahia. O material dita o desenho e a produção.
Então existe esse contexto complexo, mas que com o passar das décadas criou um expertise absolutamente único que torna a marcenaria brasileira contemporânea a mais interessante do mundo. É uma mistura entre as diferentes culturas que nos foram impostas e uma rica biodiversidade que dá a possibilidade de sermos diversos, originais. Hoje ainda mais, pois as técnicas aprimoradas se unem ao propósito do uso consciente da madeira e seu valor histórico, cada vez mais relacionado às nossas origens pré-colônia – aos povos originários e seu uso primordial da matéria com equilíbrio entre simbolismo e funcionalidade, duas características muito presentes nos desenhos atuais.
Artsoul: Existem pontos em que esse mercado pode melhorar? A MADE – Mercado Arte e Design tem uma missão nesse sentido?
BS: Sempre! A MADE nasceu justamente com essa vocação de educar nosso mercado, mostrar que design deve ser consumido com envolvimento crítico. Que o público precisa conhecer o autor daquilo que compra e saber sua história – não existe desenho anônimo. Criando essa noção de autoria, tanto para quem compra quanto para quem vende, é que se forma um mercado sólido de design brasileiro. A MADE foi a responsável por criar o movimento autoral brasileiro, “obrigando” marcas e lojas a se reeducar e vender cada vez mais um produto valorizando o nome do designer. O cenário 10 anos atrás era completamente diferente, com espaço para pouquíssimas vozes.
Artsoul: De que forma a MADE se diferencia de outras feiras de campos criativos?
BS: A MADE foi a primeira feira de design autoral colecionável no Brasil e nasceu de um lugar muito genuíno, nosso desejo sempre foi valorizar o criador e fomentar a construção de uma comunidade de design engajada. Por isso nós sempre chamamos nossos espaços de “coletivos”, não estandes. Queríamos deixar claro aos participantes que eles fazem parte de algo maior, de um amplo movimento criativo; nunca provocamos o individualismo ou senso de competição, pelo contrário. Nesse sentido, acho que a MADE é única, pois nenhuma outra plataforma conseguiu criar esse sentimento de pertencimento e relacionamento humano. Nela surgem projetos colaborativos, parcerias, novas marcas… Tudo isso faz dela hoje a principal plataforma de lançamentos do país, sejam novos nomes ou novas ideias de produtos e móveis que virão a se tornar tendência em curto prazo. O resultado disso é uma renovação constante de nosso elenco que é bem orgânica, algo difícil de se encontrar em feiras do setor que apostam sempre nos mesmos nomes. Mas de novo, isso vem de um lugar muito pessoal, me interessa o ser humano e o que o levou a criar aquela obra. Eu penso a feira como um exercício genuíno de curadoria acima de tudo.
Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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