Em Copenhagen, na Dinamarca, desde 1689, um manto tupinambá retornará ao Brasil após negociações entre o Museu Nacional da Dinamarca (Nationalmuseet) e o Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Museu Nacional). A instituição dinamarquesa informa não saber como a peça chegou até o país. A devolução é descrita como uma doação pelo Nationalmuseet.
Já reivindicado no ano de 2000 pelo povo tupinambá, o manto vermelho, feito com penas de íbis, é visto como objeto sagrado para os tupinambás – um dos primeiros povos indígenas a entrar em contato com os europeus quando estes chegaram ao que hoje é a América do Sul. No ano 2000, a peça foi exposta na “Mostra do Redescobrimento”, que ocupava quatro edifícios do Parque Ibirapuera, em São Paulo. Não há, nas coleções brasileiras, nenhum objeto do gênero que date da mesma época. Todas as demais peças semelhantes de que se sabe hoje, encontram-se na Europa, cinco delas sob a guarda da associação nacional de museus da Dinamarca.
Além do envio da peça, fez parte das negociações um acordo de cooperação para pesquisas conjuntas e projetos voltados ao público, como a digitalização da coleção brasileira atualmente exposta no museu dinamarquês.
A devolução da peça se insere no recente movimento internacional de revisão e reparação histórica, que tem contestado a posse de objetos de valor histórico por instituições ou governos que tenham sido adquiridos dentro de contextos de guerra, colonização etc. É o caso do processo que ainda corre a respeito de peças de bronze do Benin que estão na Alemanha, assim como foi o da restituição da obra Painting with Houses (1909) de Wassily Kandinsky.
Além da relevância do envio no contexto do movimento de reparação internacional, a recepção da peça pelo Museu Nacional é notória frente à destruição, quase por completo, da instituição por um incêndio em 2018. Além disso, a recepção do manto e a digitalização do acervo presente no Nationalmuseet fazem parte do plano de reconstrução das coleções do Setor de Etnologia e Etnografia (SEE) do Museu. Em suma, o projeto de Reconstrução das Coleções do SEE se baseia em três frentes: a) aquisição de novas coleções etnográficas em parceria com os povos indígenas e comunidades locais, responsáveis pela seleção e documentação das peças; b) aquisição de coleções digitais junto a museus estrangeiros referentes às coleções de etnologia indígena que se encontram fora do país; c) tratamento, catalogação e digitalização das antigas coleções do SEE.
Matheus Paiva é produtor cultural e internacionalista, formado pela Universidade de São Paulo.
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