Movimentos artísticos podem ser analisados, entre tantos outros fatores, por uma maior aproximação entre racional ou irracional na sua fundamentação. Por essa visão podemos observar como artistas se utilizam de abordagens racionais e mais metódicas, ou irracionais e mais subjetivas, de acordo com sua conjuntura.
O expressionismo abstrato, movimento essencialmente voltado à pintura e, menos expressivamente à escultura, surge nos Estados Unidos na década de 1940, a partir de uma intencionalidade voltada ao inconsciente, ao emocional.
Nenhum fenômeno artístico pode ser desvinculado de seu contexto. Tratando-se do expressionismo abstrato, a crise financeira dos anos 30 causada pelo crash da bolsa de valores em 1929, e todo impacto da Segunda Guerra Mundial, foram determinantes para a formação desse movimento artístico. Forma-se a reação da produção visual de muitos artistas durante e após um período devastador. Esse momento foi propício para que artistas experimentassem processos mais orgânicos, diferenciando-os de correntes européias, como o abstracionismo geométrico do começo do século. Entre os nomes mais conhecidos do expressionismo abstrato, destacam-se Jackson Pollock, Willem de Kooning, Mark Rothko, Barnett Newman, Adolph Gottlieb, Helen Frankenthaler e Lee Krasner.
A produção de Pollock, assim como de outros artistas desse movimento, segue investidas do modernismo, como o evidenciamento da superfície plana na pintura, rompendo com técnicas de ilusão sistematicamente desenvolvidas e aplicadas por pintores, principalmente a partir do Renascimento. Através da action painting, técnica utilizada por Pollock e De Kooning, o gesto na pintura é libertado, conduzido por uma metodologia performativa, pela qual o artista impõe outro valor ao processo de pintar. Ao colocar no chão as superfícies que receberiam a tinta, Pollock subverteu a relação entre o corpo do artista e a obra em construção. O movimento coordenado das mãos do artista não era o único fator decisivo para a construção da imagem, a intensidade do contato entre tinta e superfície gerava novos tipos de composição, que fugiam do domínio racional do artista.
A abstração é radicalizada ao seu estado mais orgânico.
As experimentações nos métodos de pintura provocaram também transformações nas relações entre arte e público. Buscava-se promover novas experiências ao espectador, cercando-o por telas em grandes dimensões com apelos sensoriais. A relação entre cor e a experiência emocional foi amplamente pesquisada por artistas desse movimento, como Mark Rothko, artista que deu origem à Colour Field Painting, junto a nomes comoBarnett Newman e Robert Motherwell, Clyfford Stell, Helen Frankenthaler, entre outros. Os blocos coloridos de Rothko não remetem a objetos ou elementos reconhecíveis, mas proporcionam ao espectador que se sensibilize pelas vibrações dos conjuntos de cores saturadas.
Essa linha derivada do expressionismo abstrato era extremamente ligada à espiritualidade e ao sensível.
A transferência do epicentro da arte ocidental, de Paris para Nova Iorque, em grande parte motivada pelo exílio de intelectuais e artistas europeus durante a guerra, é também apontada com um fator influente para o desenvolvimento do expressionismo abstrato. Neste momento, protagonistas das vanguardas européias desembarcaram no novo centro da arte, como André Breton, Salvador Dalí, Max Ernst, Leonora Carrington, entre outros. Surrealistas trouxeram consigo o automatismo psíquico, conceito e método que busca externalizar o inconsciente na arte, como vimos no processo de Pollock. As contribuições de Sigmund Freud e Carl Jung também foram essenciais para que artistas formassem seu escopo teórico ao desenvolver suas pesquisas visuais.
O expressionismo abstrato exerce até hoje grande influência na arte ocidental. No Brasil, artistas que exploraram vertentes abstratas em algum momento se aproximaram de elementos marcantes da corrente estadunidense. Entre esses artistas, que não necessariamente seguiram o movimento, mas se aproximaram deste por elementos comuns, estão Manabu Mabe, Tomie Ohtake, Flávio Shiró, Antônio Bandeira, Antonio Cabral.
A gestualidade pulsante do expressionismo abstrato permanece influenciando artistas que trabalham com pintura e desenho na arte contemporânea. Como vemos nos trabalhos de Gustavo Aragoni, o gesto é capaz de criar dinâmicas fluidas através da repetição e sobreposição, com um resultado que nos permite visualizar o processo e imaginar os inúmeros movimentos necessários para esta composição. Já a obra de Claudia Barbisan nos mostra como diferentes formas, materiais e texturas podem atuar de maneira a despertar no espectador uma gama de sensações e emoções.
Diogo Barros é curador, arte educador e crítico, formado em História da Arte, Crítica e Curadoria pela PUC SP.
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