A ArtSampa, nova feira de arte de São Paulo, acontece no formato híbrido, com exposição online e física, simultaneamente, entre os dias 16 e 20 de março na OCA localizada no Parque do Ibirapuera. A Artsoul acompanhou os preparativos e os primeiros dias da feira e separou os principais destaques.
Como tendência dos últimos dois anos, mesmo com o retorno das feiras de arte presenciais, a arte digital expande cada vez mais seu campo e se assenta em seu próprio universo. A Artsampa é um dos eventos recentes que demonstram como o universo físico e digital não competem entre si, mas se complementam em suas diferenças.
Além da apresentação no metaverso – um termo complexo e ainda vago que abrange a ideia de uma realidade virtual, um universo gerado pelo computador – as NFTs dentre outras artes digitais estiveram presente em estandes que se destacaram por levar à feira as facetas dessa linguagem.
A Metaverse Agency é a primeira agência focada no segmento de arte digital, com propriedade validada em NFTs registrados em blockchains. A galeria leva os visitantes para um metaverso com obras de 11 artistas. Conta com os artistas Beto Gatti, Alexandre Rangel e Carlos Vergara, os dois últimos que apresentam em conjunto um trabalho multimídia.
O estande buscou ilustrar aos visitantes possibilidades de aplicação física de uma arte NFT adquirida, apresentando os trabalhos em impressões, vídeos em monitores e até mesmo em forma de hologramas.
Estande da Metaverse Agency com impressões e transmissão em monitores. Imagem: Giovanna Gregório
A Yaak Gallery levou trabalhos do kryptoartista YAAK e incentivou o acesso digital à galeria e à exposição através de QR Code, ao mesmo tempo que levou impressões e vídeos dos trabalhos. O artista afirmou que compreende o processo de impressão em compasso com o processo digital, o pigmento surgindo quase como pixel.
Outras galerias também apresentaram projetos digitais tornando a feira um centro importante de assimilação da recente linguagem no ambiente comercial.
A Galeria Lume, de São Paulo, apresentou obras de Amalia Giacomini, Claudio Alvarez e Eduardo Coimbra. O estande é particularmente interessante, ocupando um espaço com duas janelas charmosas da arquitetura de Niemeyer. A galeria entendeu a feira como um espaço de experimentação e exposição, sendo assim, os trabalhos dialogam profundamente com o espaço. O trabalho de Amalia Giacomini, esteve na parede paralela à janela, e com sua poética de geometria, leveza e transparência criou uma relação de aproximação com o espaço aberto. Do outro lado, a janela foi usada para produção de um site-specific de Claudio Alvarez, e outra parte da exposição foi tomada pela presença de inúmeras nuvens luminosas produzidas por Eduardo Coimbra.
Vista da série Entreabertos Horizontes, 2021. Amalia Giacomini. Imagem: Giovanna Gregório
Vista do site-specific de Claudio Alvarez. Imagem: Giovanna Gregório
Persianas, 2021. Eduardo Coimbra. Imagem: Giovanna Gregório
As galerias Gaby Indio da Costa e Bolsa de Arte apostaram em uma diversidade de linguagens artísticas ocupando os estandes com trabalhos diversificados, de esculturas à fotografias.
A galeria Kogan Amaro apostou em uma individual do baiano Adriano Machado, intitulada Orimar. O estande contou com 3 séries fotográficas singulares e se destacou na feira de forma bem marcante. As composições feitas fazem com que as fotografias soem quase como uma performance. Com seu trabalho, Machado provoca reflexões a respeito das vivências de um jovem negro, trazendo elementos do cotidiano de forma inesperada.
Série fotográfica de Adriano Machado. Imagem: Giovanna Gregório
A Arte FASAM Galeria se destacou por costurar um tema bem intenso no estande. Os trabalhos de Ana Hortides, Lilian Camelli e Ursula Tautz estimulam lembranças e memórias afetivas ao redor da noção de lar, casa, família e acolhimento. Esse mar de sensações gerado está em compasso com a proposta da exposição, que no texto de Bianca Dias fala sobre o “gesto, memória e intimidade: escrita do corpo no mundo” esclarecendo a decisão de apresentar trabalhos que sugerem a relação com objetos e lugares que marcam a noção de pertencimento dos sujeitos.
A feira de arte abrigou espaços culturais e instituições de finalidade social como o Ateliê TRANSmoras, que se define como um agrupamento de pessoas trans que produz moda, arte e negócios. O estande tinha roupas, lambe-lambes, vídeos, fotografias e uma pluralidade de produção. A ONG Casa Chama apareceu com a mostra “A transição é coletiva”, com diferentes mídias e trabalhos de 17 artistas trans dando continuidade ao importante papel de suporte, propagação e pesquisa acerca da produção de artistas trans.
Uma vida baseada em tensão, Vulcanica Pokaropa. Casa Chama. Imagem: Giovanna Gregório
Potências Ativas articula projetos de arte buscando gerar recursos para lutas sociais, levou para a Artsampa trabalhos para levantar recursos para o @milhaspelavidadasmulheres e para @lanchonete.lanchonete. Caminhando no mesmo sentido da luta pela igualdade de gênero, o coletivo Artistas Latinas – plataforma de educação, pesquisa e difusão de artes visuais com o objetivo de traçar novos caminhos para a história da arte a partir da perspectiva das mulheres artistas latino-americanas – preparou um recorte sobre maternidade para o evento.
Oasis, centro cultural independente, espaço de pesquisa, experimentação e estudos em arte que ocupa o Saara do Rio de Janeiro ocupa um estande da feira com o projeto Provisório Permanente, uma montagem-instalação na qual as obras de três artistas emergentes vindos de contextos distintos, Gean Guilherme (Santo Amaro, RJ), Bruno Pastore (Guarulhos, SP) e Simba (Tuiutí, RJ) entram quase em simbiose na exposição.
Bruno Pastore, artista e poeta, atua nas áreas da filosofia e educação. Começou sua produção com grafite em 1998 e em 2005 passou a experimentar outros meios artísticos como a pintura em suportes não tradicionais. Ele afirma que é importante o artista transitar entre linguagens porque “é preciso estar nas ruas, nos espaços fechados, estar na educação e estar em contato e ouvindo as pessoas”. Ocupando as paredes da feira de arte paulista com grafite, a proposta dele é trazer a escrita de rua de São Paulo, concebendo o provisório permanente apresentando listas de vocabulários de emergência com estética de rua. O trabalho tem intervenções desde sugestões de palavras a adesivos e lambes colados.
Lucas Rehnman, coordenador de projetos da Oasis, afirma que o uso do papelão opera quase como desdobramento do trabalho do Geam, artista que parte de escultura de papelão para produzir sua arte 3D, e também como vontade de quebrar com a lógica esterilizada do cubo branco. Rehnman afirma ainda que o mundo da arte hoje recebe melhor arte de rua que a social criptoarte, por exemplo, que está correndo para acompanhar.
Estande Oasis finalizado antes da abertura. Imagem: Giovanna Gregório
Estande após primeiro dia de feira com intervenção do público. Imagem: Giovanna Gregório.
A feira também foi espaço de instituições como o Museu de Arte Moderna de São Paulo que marcou presença com obras da atual edição do Clube de Colecionadores com nomes como Alex Flemming, Gabriela Albergaria e Xandalu Tupã Jekupé. O Centro Universitário Belas Artes é a única instituição de ensino na edição e apresenta os trabalhos de conclusão de curso dos formandos em Artes Visuais.
A imprensa esteve presente com a revista trimestral de arte e cultura contemporânea Select. A Philos, uma casa editorial que publica produções literárias em línguas latinas e a Banca curva, banca de publicações independentes também participaram.
Vista do espaço dedicado às instituições no primeiro pavimento da OCA. Imagem: Giovanna Gregório.
Além dessas participações, a Artsampa promoveu atividades educativas, como a mostra que se propõe a contar os principais períodos da história da arte, através de 10 totens com textos e imagens com narração de Roberta Sá. O projeto chama-se “História da arte, olhar e descoberta” e vai passar por 5 shoppings (Plaza Sul Shopping, Metrópole, Campo Limpo, Taboão e D. Pedro Campinas).
Outro projeto alinhado com a educação é o Conversas ArtSampa, palestras e entrevistas que transitam desde o debate sobre o papel do colecionador e galeristas na formação de uma coleção privada de arte contemporânea em parceria com a ABACT até a discussão sobre Arte e Jogo com pesquisa de Gui Teixeira Artista.
A feira se encerra neste domingo (20) e dentre a pluralidade de projetos, também inclui a videoarte com o programa MIRA, há 6 anos em atividade na ArtRio, com instalações multicanais.
A ArtSampa por abrigar uma diversidade de instituições e projetos acabou por promover uma mostra que apesar de comercial, teve em sua maioria uma preocupação maior nas escolhas expográficas e nos projetos para apresentação, tornando-a não exageradamente volumosa e mais aprazível.
Giovanna Gregório é graduanda em Arte: Historia, Critica e Curadoria pela PUC-SP. Pesquisadora e crítica independente.
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