A cidade de São Paulo conta a história da arte através de sua arquitetura. O movimento modernista está inscrito em construções icônicas e surgiu na primeira metade do século XX como uma reação ao excesso de ornamentos das edificações vigentes na época.
O movimento valorizava a funcionalidade, as formas puras e a integração entre interior e exterior, além da luz natural, ventilação, materiais naturais e soluções que levassem em conta o contexto tropical. Em São Paulo, desenvolveu-se costurando influências internacionais, como a Bauhaus e Le Corbusier, sem deixar de considerar o clima, a paisagem e a vegetação locais, explorando o uso do concreto, do vidro e das estruturas geométricas. Neste roteiro, é possível conhecer cinco casas que expressam os pilares dessa manifestação artística.
A Casa Modernista, projetada em 1927 e finalizada em 1928, é considerada a primeira obra de arquitetura moderna do Brasil. O projeto, assinado pelo arquiteto ucraniano Gregori Warchavchik, que também residiu na casa, desafiou os padrões estéticos vigentes na época com sua volumetria simples, ausência de ornamentos e fachadas brancas e lisas. A construção evoca princípios modernistas de racionalidade e funcionalidade, traduzidos em uma residência que foi inicialmente vista com estranheza pela sociedade conservadora da época, mas que abriu caminho para o novo estilo.
O jardim foi elaborado pela esposa do arquiteto, Mina Klabin, que foi pioneira no uso de espécies tropicais no paisagismo do local. A visita permite uma imersão completa na história da casa e do movimento, sendo possível observar a aplicação de conceitos como a planta livre e a horizontalidade das linhas, integrando a construção ao seu entorno verde.
Projeto da italiana Lina Bo Bardi de 1951, a Casa de Vidro é a primeira construção da arquiteta no país. A residência traduz o desejo de abrir a casa para o entorno e fazer com que as construções sejam permeáveis e conectadas com a paisagem. Localizada no Morumbi, a casa se destaca por sua estrutura elevada em pilotis – ou colunas – na parte frontal, que a faz “flutuar” sobre a encosta, e pelas grandes superfícies de vidro que buscam uma conexão entre interior e natureza. O jardim cresce embaixo da casa promovendo a integração com a paisagem, tão cara ao movimento.
A construção é a sede do Instituto Bardi e pode ser visitada com passeios guiados, que exploram o espaço e o acervo do casal Bo Bardi que conta com mobiliário, objetos e fotografias.
A residência de João Batista Vilanova Artigas, expoente da chamada “Escola Paulista” da arquitetura moderna, é marcada pelo uso maciço de concreto aparente e pela ênfase na espacialidade e nas grandes aberturas. A casa, na Rua Barão de Jaceguai, é a segunda projetada por Artigas para sua família e revela a habilidade do arquiteto de criar espaços internos fluidos e iluminados, como manda a planta livre, que permite que os cômodos sejam dispostos com flexibilidade, pela redução de paredes estruturais.
Patrimônio tombado, a casa tem sido utilizada como um centro cultural e de estudos dedicado à obra do arquiteto. Seus interiores possuem pilares redondos e paredes de tijolo pintado de azul, uma oportunidade para o público conhecer de perto a arquitetura brutalista.
A Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, que ocupa uma antiga residência modernista, é uma pérola arquitetônica em meio a um parque no Morumbi. A casa, embora não seja um exemplar de vanguarda radical como a Casa de Vidro ou a Casa Modernista, reflete o modernismo residencial elegante e integrado à natureza típico de São Paulo dos anos 1950. A arquitetura se harmoniza com o paisagismo de Otávio Augusto Teixeira Mendes, criando um conjunto de grande valor histórico e artístico.
Além de abrigar um importante acervo de artes decorativas e históricas brasileiras, a Fundação é um convite para contemplar seu parque de 75 mil m², projetado para complementar a casa. O local proporciona uma visita completa que une arquitetura, arte, história e paisagismo, oferecendo exposições temporárias e um salão de chá.
A residência projetada e habitada pelo designer e arquiteto polonês Jorge Zalszupin, um expoente do design modernista brasileiro, é um exemplo da integração entre a arquitetura moderna e a produção de mobiliário de vanguarda. Zalszupin, fundador da renomada empresa de móveis L’Atelier, aplicou em sua própria casa os princípios de simplicidade, materiais nobres e funcionalidade, que guiavam suas criações de design.
A Casa Zalszupin está localizada no Jardim América e, embora não tenha uma visitação regular aberta ao público, é frequentemente incluída em roteiros e eventos de design e arquitetura, muitas vezes em conjunto com a Casa Museu Ema Klabin.
A residência da artista plástica Tomie Ohtake, projetada por seu filho, o arquiteto Ruy Ohtake, no Campo Belo, é um exemplo de uma arquitetura que, embora mais tardia (1971), bebe nas fontes do modernismo, mas o transforma em um estilo pessoal e orgânico. Diferente da rigidez geométrica da primeira geração, Ruy Ohtake utilizou linhas curvas e formas esculturais para criar um espaço que é quase uma obra de arte habitável, característica que se tornou sua marca registrada.
O projeto revela a busca por uma identidade arquitetônica brasileira, explorando as potencialidades do concreto e a liberdade formal. A casa, que conquistou prêmios e foi cenário da vida e obra de Tomie Ohtake, permanece como um importante manifesto da arquitetura contemporânea brasileira, mantendo o legado de experimentação e inovação do modernismo.
Além das residências, São Paulo tem em sua paisagem urbana edifícios e espaços públicos que incorporam os ideais modernistas: escala urbana, forma funcional, espaços de convívio. A Galeria do Rock, a Galeria Metrópole, o Conjunto Nacional, o Parque Burle Marx e o prédio da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP) são alguns exemplos.
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