No mês de abril, foi lançada a nona edição do relatório Mercado Global de Arte Art Basel e UBS, realizado pela plataforma Art Economics. Com mais de 200 páginas, o levantamento tem como objetivo mapear e analisar o desempenho de galerias, revendedores, casas de leilão e feiras de arte em relação às mudanças econômicas e de riqueza em escala mundial.
Gráfico das vendas no mercado global de arte 2009-2024. Imagem: Art Basel & UBS Art Market Report 2025
Para começar, os dados revelam que, no último ano, o setor das artes passou por uma retração geral: após expressiva recuperação no período pós-pandêmico, as vendas voltaram a recuar pelo segundo ano consecutivo. O volume total comercializado caiu 12% em relação a 2023, somando US$57,5 bilhões. Essa queda se deve, em grande parte, ao enfraquecimento das vendas de alto custo.
O que acontece é que o número total de transações não caiu – pelo contrário, cresceu 3% em 2024, somando cerca de 40, 5 milhões de operações em todo o mundo. Esse aumento, quando comparado à queda anterior, evidencia uma mudança no perfil do mercado, com mais obras sendo vendidas, porém a preços mais acessíveis. Tanto casas de leilão públicas quanto revendedores tradicionais relataram quedas no último ano (com recuos de 6% e 25%, respectivamente), enquanto as vendas privadas de leilões avançaram 14% no mesmo período.
Os Estados Unidos mantiveram a liderança como o principal mercado de arte do mundo, com 43% de participação no total de vendas globais, um ponto percentual acima do ano anterior. Apesar disso, as vendas no país caíram 9%, chegando a US$ 24,8 bilhões. O relatório associa esse resultado à instabilidade provocada pelas eleições presidenciais e a um ambiente econômico mais cauteloso, especialmente no segmento de obras de altíssimo valor. Ainda assim, o país continua apresentando números significativamente acima dos registrados em 2020, no auge da crise pandêmica.
O Reino Unido voltou à segunda posição no ranking global, com 18% do mercado e vendas estimadas em US$10,4 bilhões. A leve retração de 5% no valor movimentado não impediu que o país ultrapassasse a China, cuja participação caiu para 15%. O mercado chinês, que vinha de uma recuperação em 2023, sofreu forte retração de 31% no último ano, recuando para US$8,4 bilhões — seu pior desempenho desde 2009. O relatório aponta fatores como o crescimento econômico mais lento, a crise no setor imobiliário e incertezas políticas como causas principais para essa reversão.
Na Europa continental, o cenário também foi de desaceleração. A França, que permanece como o quarto maior mercado mundial, teve uma queda de 10% nas vendas, somando US$4,2 bilhões. A participação do país nas vendas globais, no entanto, manteve-se estável em 7%. No total, os países da União Europeia movimentaram US$8,3 bilhões, uma queda de 8% em relação ao ano anterior.
Já a Ásia apresentou resultados variados. Enquanto a Coreia do Sul teve retração de 15%, o Japão registrou um crescimento modesto de 2%. São dados que ilustram a complexidade do mercado asiático, que responde de formas diferentes às transformações econômicas locais e mundiais.
A pesquisa ainda aponta que o comércio online, impulsionado nos últimos anos pelas restrições da pandemia, também apresentou sinais de ajuste. Em 2024, as vendas digitais caíram 11%, somando US$10,5 bilhões. Ainda assim, representa 18% de todo o mercado, um índice estável em relação ao ano anterior, embora abaixo do pico de 25% registrado em 2020. Comparado ao cenário pré-pandêmico de 2019, porém, o avanço ainda é significativo — as vendas online estão 76% acima daquele patamar.
Gráfico de vendas no mercado de arte e antiguidades online 2014-2024. Imagem: Art Basel & UBS Art Market Report 2025.
O desempenho das galerias e concessionárias também caiu. O setor movimentou US$34,1 bilhões em 2024, uma redução de 6%. As grandes galerias (que têm faturamento superior a US$10 milhões) foram as mais afetadas, enquanto os revendedores menores apresentaram resultados melhores. Aqueles com receita inferior a US$250 mil registraram um crescimento expressivo de 17%, consolidando dois anos consecutivos de recuperação após um desempenho fraco em 2021 e 2022. Revendedores com receita entre US$1 milhão e US$ 5 milhões também tiveram aumento nas vendas (10%).
Artistas e galerias de médio porte têm ganhado espaço, especialmente aqueles que desenvolvem trabalhos com foco em narrativas locais, questões identitárias e formatos híbridos. Esses projetos têm atraído colecionadores mais jovens e interessados em construir coleções com valor simbólico, não apenas financeiro. A descentralização do circuito tradicional, dominado por cidades como Nova York, Londres e Hong Kong, também tem beneficiado essas práticas.
Um ponto curioso da pesquisa diz respeito à mudança na preferência por tipos de obras. Segmentos mais tradicionais, como arte moderna, arte pós-guerra e antigos mestres da pintura apresentaram vendas estáveis ou em crescimento, enquanto o mercado de arte contemporânea — especialmente de artistas nascidos após 1945 — recuou 11%. Segundo os negociantes entrevistados, os preços mais altos ficaram concentrados em artistas já consagrados, enquanto os nomes mais recentes tiveram bom desempenho, porém com valores menores.
Além dos contemporâneos, outros setores também enfrentaram dificuldades. Negociantes de antiguidades, por exemplo, relataram uma queda de 11% nas vendas em 2024. Da rentabilidade geral do setor, 43% das empresas disseram ter sido menos lucrativas que no ano anterior, contra apenas 32% que registraram melhoria. Trata-se de um cenário provavelmente causado pela queda nas vendas e o aumento de custos operacionais.
O saldo do relatório é um mercado em transição. Se por um lado os altos valores e os grandes leilões perderam fôlego, por outro há um crescimento consistente na base do mercado, com mais transações e maior acessibilidade para os outros compradores. O setor das artes encontra caminhos para se adaptar, seja por meio da digitalização, da revalorização de obras clássicas ou da diversificação dos perfis de compradores, e novas oportunidades surgem.
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